SÃO
PAULO: O NASCIMENTO DE UMA METRÓPOLE
Luiz Carlos Soares Pereira
Luana de Paiva Pires
Resumo
Este trabalho tem como objetivo propor uma
reflexão através de um analise
nas transformações sociais do
final do século XIX e inicio do século
XX na cidade de São Paulo. Para tanto,
as questões econômica e social
serão aqui analisadas. No final do
século as elites cafeeiras paulistas
promoveram uma remodelação no
espaço urbano da capital paulista.
Com isso, uma massa de despossuídos
que habitava as áreas centrais é
deslocada para áreas periféricas,
gerando, obviamente, uma segregação
social. O ideário de modernidade das
elites paulistas, associadas à prática
higienista, prestou-se a projetos no sentido
de transpor o atraso do país em relação
a outros grandes centros urbanos do mundo.
Concentramos nossa analise no drama que as
classes despossuidas enfrentaram nesse período
diante da dominação das classes
dirigentes.
Palavras-chaves: Dominação.
Resistência. Subordinação.
Este artigo tem como objetivo tratar das transformações
sociais ocorridas no final do século
XIX e inicio do século XX na cidade
de São Paulo. Transformações
estas que ocorreram no campo econômico,
no campo político e no campo social.
Todas com o objetivo de adequar a nova metrópole
a um processo de modernidade. Para tanto,
neste trabalho nos deteremos principalmente
no campo social com o intuito de mostrar as
formas de relações que se estabeleceram
neste período e durante este processo
de dominação, resistência
e subordinação das classes desfavorecidas.
No final do século XIX as elites paulistas,
enriquecidas pela exportação
do café, começaram a mudar-se
para a capital paulista, cidade que já
sofria com uma explosão urbana. As
imigrações para a metrópole
ocorriam, ora para fugir das epidemias de
cidades do interior, ou para fugir da vida
dura do campo em busca de melhores condições
de sobrevivência. Em 1888, com a abolição
dos escravos, os libertos faziam o mesmo caminho,
ainda durante o período final do século
XIX e inicio do século XX, a capital
recebia imigrantes europeus e imigrantes vindos
de outras partes do país. O que ocasionava
um crescimento desordenado da cidade na passagem
do século, causando, o aumento desenfreado
de uma população de marginalizados.
Por outro lado, a elite cafeeira, enriquecida
pela exportação do café,
começou a mudar-se para a cidade com
um ideário de modernidade, detentora
de poder político tanto no âmbito
estadual como nacional, pretendia apagar os
traços que lembrassem um passado provinciano
e inserir São Paulo num contexto mundial
das grandes metrópoles como Nova York,
Chicago, Londres e Paris e torná-la
ainda o centro econômico do País.
O café condicionou o desenvolvimento
da Província, e este posicionamento
é ratificado por BRUNO apub HOLANDA
(1954, p. 889).
O começo do movimento regular de constituição
de sociedades anônimas; a fundação
do segundo Banco do Brasil; a primeira linha
telegráfica, a organização
do Banco Rural e Hipotecário e a primeira
estrada de ferro do país. Particularmente
agiria sobre o destino da cidade de São
Paulo [...] (BRUNO, 1954, p. 889).
Como
se vê, São Paulo sofreu diretamente
os reflexos desta modernização,
como por exemplo a implantação
das estradas de ferro que articularam o interior
paulista para escoamento da produção.
Na capital, concentrava-se toda a estocagem
da produção cafeeira, assim
como na cidade de Santos, esta, porém,
de grande importância para o desenvolvimento
da metrópole sendo que além
de deter o porto, continha casas comerciais,
escritórios, armazéns e postos
de arrecadação o que fazia com
que homens de negócios se deslocassem
para lá todos ao dias, a fim de dirigir
as exportações e descargas.
Toda esta movimentação de deslocamento
diário afirma Ernani Silva Bruno; “motivava-se
pelo fato de São Paulo ter um clima
agradável e Santos sofrer com temperaturas
excessivas no verão” (BRUNO,
1954, p. 903).
Este processo de ocupação dos
centros urbanos no país, não
está relacionado a fatores ligados
à industrialização, mas
sim a um processo que se inicia no período
imperial por medidas governamentais para dinamizar
a economia do país e que tem influência
direta nas classes pobres e despossuídas.
A “Lei do Ventre Livre”, de 1871,
que declarava livre todo o filho de mãe
escrava que nascesse após a promulgação
desta lei; a “Lei do Sexagenário”,
de 1885, que decretava alforria a todos os
negros maiores de 65 anos e, finalmente a
“Lei Áurea”, de 1888, que
determinou o fim da escravidão são
exemplos clássicos desse processo migratório
para centros urbanos. Neste mesmo âmbito
também as imigrações
de europeus para o Brasil que dentro de um
processo de uso de mão-de-obra, primeiramente
para suprir a carência das lavouras
de café, tem enorme relevância
no inchaço das cidades (BRUNO, 1954,
pp. 908-911).
Assim, por volta do ano de 1897, a população
paulistana chegava aos trezentos mil habitantes.
O produto deste processo cruel e excludente
por parte das classes dirigentes, foi que
os negros libertos foram despejados de suas
residências onde trabalhavam nas lavouras
de café, devido uma lógica nova
nas relações de trabalho. Os
negros com isso buscavam as cidades à
procura de emprego, residência ou então
ficavam perambulando pelas cidades, e acabavam
juntando-se a uma parcela de pobres que já
existiam nas cidades. Paralelamente a este
processo as elites paulistanas também
se moviam do interior do estado para instalar-se
na capital. E são eles que vão
remodelar o espaço urbano, transformando
a cidade a seus gostos e seus ideários.
A metrópole que nascia passa a ser
marcada por grandes contrastes, ou seja, uma
cidade de inúmeras fronteiras. Ernani
Silva Bruno apub Caldeira Brant nas suas “Memórias
de um Estudante”, observou esta transformação;
Alguns anos mais tarde – em 1897 –
com seus trezentos mil habitantes e apesar
de suas ruas maltratadas, seus bondinhos de
burro e seu aspecto ainda um tanto “colonial”,
ela já podia deslumbrar, por exemplo,
os estudantes provincianos que vinham de Minas.
“Para quem viera de Ouro Preto –
observou Caldeira Brant nas suas Memórias
de um Estudante - aquilo era uma Paris em
ponto pequeno. Não me fartava de passear
pelo Triangulo, entrando nos cafés
e confeitarias.” (BRUNO, 1954)
Na
década de 1880, o centro da cidade
foi totalmente transformado, suas praças
e jardins públicos foram reorganizados.
Em 1900 e 1910 inúmeras obras transformaram
a paisagem urbana, sempre sobre o comando
do prefeito Antônio Prado que exerceu
quatro mandatos consecutivos. (1899-1910)
Ainda durante este período, praças
foram abertas, ruas foram alargadas, criou-se
o parque do Anhangabaú e reformaram-se
os jardins da praça da Republica. Em
1913 inicia-se a construção
de uma nova catedral, enfim São Paulo
adquiriu ares europeu com passeios e gramados
bem cortados e edifícios, e ainda o
Teatro Municipal inspirado na Ópera
de Paris. O mercado financeiro o comércio
sofisticado juntando ao espaço de lazer,
destinado à elite, e enormes palacetes
foi o que se concentrou no centro.
As elites instalaram-se em regiões
altas como Campos Elísios e Higienópolis
e a população pobre que habitava
o centro fora deslocado para zonas baixas
próximas a rios e córregos,
onde os efeitos das chuvas freqüentemente
eram sentidos. Este foi o processo de transformação
do espaço urbano que combinou com uma
política paralela que organizou para
as elites uma cidade dentro da cidade. Portanto,
das áreas centrais foram afastados
todos aqueles que não podiam enfrentar
uma inflação que em 1916 e 1936
chegou a 450% no centro e a 364% nos arredores
do centro. Este processo que a cidade de São
Paulo sofreu nos âmbitos arquitetônicos
e sociais, foi um projeto do poder publico
e das elites no sentido de inserir a cidade
em um novo modelo de social, sustentado por
um ideal positivista e capitalista onde tinha
como objetivo a reordenação
dos espaços geográficos. Os
resultados destas novas concepções
foi o controle das ruas pelo poder publico
e a “limpeza” das famílias
indesejadas das áreas centrais da metrópole
paulistana.
Neste contexto, a virada do século
foi de grandes mudanças não
só para São Paulo, mas também
em todas as grandes cidades do país.
O novo regime republicano, o fim da escravidão,
a imigração, as ferrovias e
a incipiente industrialização
redefiniam as condições de trabalho.
Estas mudanças para uma minoria da
população representavam progresso,
mas para a grande massa representava miséria
e exclusão. Com o aumento de marginalizados,
as elites paulistanas, diante deste quadro
de alterações sociais tomam
para si o controle das ruas, criam-se mecanismos
de dominação, que em contra
partida abrem-se focos de resistência
proletária. Durante o império
as relações de trabalho eram
baseadas na força, na coação,
no autoritarismo e violência, já
no período republicano as práticas
de coação dão lugar a
um sistema jurídico (AZEVEDO, 1995,
p. 63). E é o judiciário, conforme
afirma a historiadora Gislaine Campos Azevedo,
que se afirmara dentro desse processo.
Cada vez mais o judiciário irá
se apresentar como um espaço e caminho
de construção e afirmação
das demandas das classes dominantes sobre
os setores populares [...] Aos poucos, o poder
(re)constituía-se atendendo aos apelos
dos “cidadãos” e definindo
novas leis e padrões de comportamento
com o objetivo de delimitar espaços
a esta população apresentada,
muitas vezes, como perigosa (AZEVEDO, 1995,
p. 63).
Todo
este processo não só de São
Paulo, mas de outras metrópoles levou
as autoridades competentes a desenvolverem
um aparato policial com a finalidade de garantir
os direitos do cidadão, a ordem e o
respeito com objetivo de intimidar através
do uso da violência. Se anteriormente
as relações de ajuda a pobreza
estavam ligadas à caridade, e as relações
de trabalho eram delineadas pelo escravismo,
agora as práticas são disciplinadoras
para os pobres, sejam no espaço publico,
nas relações de trabalho ou
na família. Neste ambiente, São
Paulo crescia vertiginosamente e os problemas
se acumulavam, as reclamações
cresciam pela falta de policiamento, de saneamento
básico, de moradias, de instituições
adequadas para envio da população
classificada como perigosa, e principalmente
pela falta de uma legislação
moderna. Os problemas enfrentados pelo poder
público e, especificamente, o Poder
Judiciário, esbarravam na falta de
uma legislação que atendesse
essas demandas, visto que as que possuíam
eram do período imperial, e o novo
Código Civil só foi terminado
em 1916 e passando a vigorar um ano após
(PATTO, 1999, p. 172).
Todo este período foi marcado pela
repressão das classes dominantes a
vários movimentos do proletariado em
São Paulo, como na Cia. Doca Santos,
em 1904, a greve dos ferroviários em
1906, na greve dos colonos das fazendas de
café em Ribeirão Preto, na primeira
greve geral com cinqüenta mil trabalhadores
da cidade de São Paulo em 1917 entre
outras (PATTO, 1999, p. 172). É interessante
ressaltar que esses movimentos embora fossem
de grande impacto no modelo capitalista no
país, não tinham força
devido a um sistema corporativista das oligarquias
estaduais. As alianças e um sistema
de clientela nos setores rurais não
agregavam forças para os movimentos
urbanos diferenciando-se de movimentos ingleses,
por exemplo, os quais se articulavam tanto
na luta proletária como em modalidades
de crimes.
À medida que o judiciário se
adequava ao novo sistema tornava-se cada vez
mais alto o número de prisões
pelo aparato policial. Crimes como os de contravenção
viraram corriqueiros em São Paulo,
destacando-se os estrangeiros com a “desordem”,
os brasileiros com “vadiagem”,
delitos estes geralmente imputados aos negros.
Azevedo em sua dissertação de
mestrado explana uma vasta documentação
deste período e observou o trabalho
do chefe de policia da capital paulista onde
demonstra que eram correntes estas práticas
nos documentos oficiais do período.
[...] tendo notado em junho que o numero de
mendigos estrangeiros crescia notavelmente
na capital, tratei de pesquisar e verifiquei
que os pontos mais populosos eram elles preferidos,
porque ahi a colheita de esmolas era mais
prompta e copiosa. Soube até de mendigos
de fora da capital que aqui vinham chamados
por parentes ou collegas, explorar aquela
vantagem. Determinei então, que lhes
fosse vedada à entrada no centro da
capital e noutros pontos mais concorrido [...]
(RIBEIRO, 1993).
Mediante
estas questões, o trabalho era a forma
de evitar a mendicância ou a criminalidade
. Para isso, as crianças começavam
a trabalhar aos cinco anos, em fábricas
em condições desumanas, tudo
para complementar a renda familiar. Em fábricas
têxteis conforme afirma Maria Alice
Ribeiro em seus estudos, analisando as condições
das mulheres e crianças nas indústrias
paulista neste período, o que vem a
ser de grande relevância para identificarmos
as perspectivas de trabalho desta época.
Evidência que nas indústrias
em 1894 empregava-se 5.019 operários.
Deste total, 840 eram do sexo feminino e 710
eram menores de idade. Portanto, quem restava
ficava fora do mercado de trabalho, logicamente
o destino eram as casas de assistenciais sempre
dentro de um ideário dominador, de
assistência, primeiramente, mas com
o direito de reprimir ou penalizar os que
não se enquadravam dentro deste modelo
social da nova metrópole. E é
dentro desta lógica que o resultado
não se resumiu à fronteiras
sociais, mas também no controle das
ruas, intervenção em moradias
e segregação espacial. Dentro
desta analise das relações econômicas
e sociológicas Massimo Quaini apub
F. Engels explica este processo social, decorrido
na Inglaterra em 1845 construindo uma análise
dialética e nos mostrando o esplendor
da miséria da primeira grande cidade
capitalista.
Esta imensa concentração, esta
aglomeração de dois milhões
e meio de homens em um só ponto centuplicou
a força destes dois e meio; elevou
Londres à posição de
capital comercial do mundo, criou gigantescas
docas [...] Mas é somente em seguida
que se descobre quantos sacrifícios
custou tudo isso. Após ter pisado por
alguns dias o chão das ruas principais,
após ter penetrado com grande dificuldade
no formigueiro humano, entre as filas intermináveis
de tílburis e carroças, a pos
ter visitados “bairros feios”
da metrópole, somente então
se percebe que estes londrinos tiveram que
sacrificar a parte, melhor de sua humanidade
pra realizar todos aqueles milagres de civilização
de que sua cidade esta repleta, que centenas
de forças latentes neles permaneceram
inativas e foram sufocadas para que só
alguns pudessem desenvolver-se mais plenamente[...]
(QUAINI, 1995, p. 51-52).
Decorridos mais de cinqüenta anos, as
semelhanças ou analogias dentro de
uma análise econômico-sociológica
identificaremos problemas semelhantes, claro
que em proporção menores, mas
que aqui no Brasil assustava as elites dominantes
e requeria medidas enérgicas (QUAINI,
2002, p. 145). Esta justificava do presidente
Washington Luís, quando foi secretário
de Justiça e da Segurança Pública
de São Paulo, classificando as questões
sociais e os conflitos como “caso de
polícia”, assegura todas as medidas
políticas implantadas no período
da primeira república como às
práticas higienistas das quais trataremos
a seguir.
Na formação da nova metrópole,
os cafeicultores não mediram esforços,
seja no âmbito econômico ou no
âmbito social, com o objetivo de reorganizar
o espaço urbano, modernizando todos
os seguimentos para as elites, o que gerava
duas São Paulo, delimitando uma fronteira
social, justamente num período transitório
político onde vários segmentos
da burguesia brasileira buscavam seu lugar
neste cenário.
O Crescimento de São Paulo, na virada
do século XIX, é proporcionado
pelo desenvolvimento da cafeicultura, e pelo
novo sistema por ele implantado, o trabalho
assalariado. O trabalhador assalariado passava
a ser consumidor na economia de mercado diferentemente
do escravo que só integrava a economia
de subsistência. O crescimento das exportações
gerou um aumento da renda real, os trabalhadores
transformavam a totalidade, ou quase, de sua
renda em artigos de consumo isso favoreceu
o crescimento do mercado interno. São
Paulo transforma-se em uma grande metrópole,
pois constituía um mercado de capital
e trabalho que proporcionaram uma rápida
expansão do mercado interno, fatores
fundamentais para o desenvolvimento das indústrias.
Até 1930, o café era o grande
motor da econômica brasileira. Porém,
o crescimento da indústria paulista
foi o fenômeno que promoveu novas alternativas
no contexto social e econômico brasileiro,
criando condições para o surgimento
e a modernização da cidade,
embora não ampliasse vigorosamente
as oportunidades de trabalho, afinal, houve
significativo refluxo de mão-de-obra
nas atividades ligadas ao campo, especialmente
o cultivo do café. Este processo teve
como conseqüência um problema de
ordem social, um grande contingente populacional
que não fora absorvido nem pelo café,
nem pela indústria nascente, crescia
as margens deste sistema.
Instalaram-se em São Paulo fazendeiros
do café, que precisavam ver de perto
a comercialização do produto,
vinham com suas famílias e passaram
a gastar parte da renda obtida com o café
na cidade. Isso favoreceu a expansão
dos setores de serviço artesanato,
comercio varejista e alguns setores da indústria.
São Paulo desenvolveu também
um grande mercado de trabalho devido chegada
de imigrantes, como a cidade era ponto natural
de passagem destes imigrantes, acabava absorvendo
grande parte destes. Desenvolvem-se hospedarias
para os imigrantes, onde os fazendeiros procuram
por mão-de-obra e os trabalhadores
por empregos. Estabeleceram-se na cidade,
negros e mulatos, os quais desde a abolição,
viviam à margem da sociedade.
A vinda de imigrantes materializou a teoria
de embranquecimento e agravou o racismo, não
dando plenos direitos de cidadão os
negros, e prejudicando a incorporação
destes na indústria nascente. A absorção
dos libertos e forros pelo mercado de trabalho,
exigia adequações culturais
e maior presença do Estado. O Estado
deveria conceder diretos de cidadão.
O problema tornou-se também racial,
pois o negro para as elites brancas não
era como as outras etnias, não sendo,
desta forma, inserido no mercado de trabalho
e nem na sociedade. Para justificar a não
incorporação do negro, as elites
utilizaram-se de teorias “cientificas”
como o darwinismo social, baseado na crença
da inferioridade dos não brancos. A
mestiçagem, da qual o povo brasileiro
era fruto, foi negada e inferiorizada por
intelectuais da época que queriam dar
características positivas ao povo brasileiro.
Negando a participação do negro
nesta formação e caracterizando
a mestiçagem como algo pejorativo.
A adequação econômico-social
do Brasil no novo sistema foi lenta, o sistema
monetário existente no país
era inadequado ao trabalho assalariado. Os
trabalhadores tinham seus salários
afetados pela taxa cambial, quando havia depreciação
cambial ora pela queda dos preços das
exportações ora pela expansão
creditícia imoderada, gerando inflação,
que era muito sentido nas zonas urbanas que
consumiam grandes partes de produtos importados.
Em épocas de crises faziam-se fortes
pressões sobre a classe assalariada
das zonas urbanas.
Os trabalhadores pobres vendiam sua força
de trabalho por um salário miserável
que muitas vezes não dava para seu
sustento, então se dedicavam também
a outras ocupações. Os negros,
por sua vez, viviam em condições
piores. A abolição sem reforma
agrária, os deixou sem as mínimas
condições de sobrevivência,
sofrendo preconceito racial, tinham menos
condições para arrumar empregos.
Por isso, muitas vezes se submetiam a viver
como agregados em casa de famílias
ricas, em funções domésticas
sem remuneração, ex-escravos,
viviam em condições de escravos.
A grande população, nas zonas
urbanas, favorecia os proprietários,
pois as pessoas se sujeitavam à longas
jornadas de trabalho, sem direito a férias
e só recebiam os dias trabalhados,
em caso de doenças não recebiam.
Os salários eram pagos por semana o
que dificultava manter-se em greves. O grande
número de desempregados, pessoas que
viviam em condições mínimas,
teve como conseqüência o aumento
da violência. Muitos roubavam para poder
sobreviver, outros se entregavam aos vícios,
como alcoolismo. Os registros policias da
cidade de São Paulo, sobressaem três
ocorrências a de vadios e capoeiras,
que eram atribuídos a negros, mulatos
e brancos podres, para denominar as infrações
cometidas por estes, usava-se como sinônimo
a vadiagem. Era grande o numero de furtos
feitos pelos “vadios”, que batiam
carteiras, roubavam alimentos, roupas e sapatos,
conseqüência da falta de oportunidades.
O período da República Velha
é marcado pelo conflito entre a população
e os policiais. Conflito entre a velha e a
nova ordem, tensão da transição
do escravismo para o trabalho assalariado,
desenvolvimento industrial, movimentos operários
entre outros. O Estado que deveria amenizar
as tensões, dando diretos sociais à
população, porém, estavam
juntamente com a polícia diretamente
ligados às classes dominantes. Os representantes
do governo eram oriundos destas classes, e
os policiais tinham boas relações
com os oligarcas, reprimiam a população
fazendo representar os interesses da classe
dominante. As populações eram
atribuídas diversos crimes, porém
estudos mostram que os policias também
praticavam crimes.
A população era vítima
tanto do abuso de autoridade como também
de roubos feito pelos policiais. Os imigrantes
eram as principais vitimas, quando lhes pediam
os documentos, sacavam-lhes as carteiras e
tinham seu dinheiro roubado. Além dos
assaltos, muitas vezes aconteciam violências
sexuais. Os policiais envolviam-se com jogos
e prostituição, formas que os
marginalizados encontravam de sobreviver.
Os pobres viviam em cortiços, sub-habitações,
com condições sanitárias
precárias, e o perigo de epidemias
era um fator constante. Os sanitaristas alertavam,
pedindo intervenção do setor
público, como alternativas construíram-se
moradias populares, o que não solucionou
o problema, pois o número de pessoas
que viviam nestas sub-habitações
eram muito grandes. Então, a administração
pública do estado de São Paulo,
com objetivo de prevenir epidemias, fruto
da falta de higiene, proibiu construções
de novos cortiços e derrubou os existentes,
exigindo que as moradias construídas,
a partir de então, seguissem normas
de construção e higiene. Mas
por trás disso, estava o interesse
imobiliário, pois os pobres foram expulsos
das áreas centrais para os subúrbios,
e nos subúrbios se reinstalavam de
formas semelhante à que viviam nos
centros, porém, distante dos pontos
de interesse imobiliário.
Como os trabalhadores não tinham condições
para construir moradias, nos subúrbios
persistiram as más condições
de vida. Já nas regiões centrais,
a reurbanização da cidade deu
uma cara nova para as áreas nobres,
afastando para a periferia os pobres, que
continuam a estabelecer suas moradias desordenadamente.
Essa foi uma conseqüência do novo
sistema que excluía a maioria, que
formava uma reserva estratégica de
mão-de-obra, obrigando o trabalhador
a submeter-se a baixos salários. Salários
que não atendiam às necessidades
básicas do trabalhador, possibilitando
uma maior acumulação de capital
daqueles que detinham os meios de produção.
Conclusão
Neste artigo, procuramos demonstrar as relações
sócio-econômicas durante o período
da Republica Velha e suas transformações
neste período. Escolhemos a cidade
de São Paulo, pois entendemos que do
final do século XIX até a década
de 1930, a população da capital
paulista sofreu uma metamorfose em seu comportamento,
hábito e modo de convivência.
Período este, onde vários grupos
sociais procuravam espaço e afirmação,
seja no campo político ou econômico,
ou na esfera federal e estadual. O certo,
é que as elites cafeeiras de São
Paulo condicionaram o desenvolvimento da província,
época que a cidade se beneficiou da
fixação dos imigrantes europeus.
Tamanha era a rapidez que a cidade de São
Paulo crescia, que medidas do poder público
foram necessárias para “civilizar”
a população. A presença
do aparato repressivo como medida de manter
a ordem pública, assegurava-se em concepções
político-filosóficas de cunho
evolucionista. Através desse pretexto
ou sob a alegação de que estava
em jogo era a ordem pública, os donos
do poder não mediam esforços
para usar a força e retirar os indesejáveis
que consideravam não aptos para este
novo modelo social e econômico. O uso
de métodos científicos e a hiegienização
foram medidas que buscavam superar a humilhação
frente ao atraso do país e a outros
centros urbanos desenvolvidos. A resistência
popular esbarrava na falta de estratégias
eficientes para luta, e com isso o poder publico,
se aparelhava principalmente nas esferas judiciais.
Desde o nascimento da Republica, uma das coisas
que os governos procuraram aprimorar foi à
polícia, a ela eram delegados poderes
para garantir a ordem e o respeito. Diante
disto, a violência, a repressão
e a intimidação, resolviam as
questões sociais da grande metrópole
do país nesse período.
No nosso entendimento, o nascimento de um
aparelho burocrático e moderno organizado
pelas classes dominantes foi uma nova ordem
que disciplinou a sociedade, portanto, neste
período a ordem urbana foi instaurada,
mesmo que tenha se chocado com as diversidades
da vida cotidiana, pois ela se impôs,
não se importando com as fronteiras
sociais que ia criando, pois era tudo pela
modernidade.
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