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REVISTA DOS ALUNOS DE GRADUAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO
DA FACULDADE PORTO-ALEGRENSE - FAPA

PORTO ALEGRE - RIO GRANDE DO SUL - BRASIL

 
Revista Historiador - Ano 01 - Número 01 - Dezembro 2008
 

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A INFLUÊNCIA DO IDEALISMO DE ALBERTO PASQUALINI NO GOVERNO JOÃO GOULART
(1961-1964)

Alexsandro Witkowski
Tassiane Melo de Freitas

Resumo
O objetivo central da investigação é compreender a realidade histórico-social brasileira, no período conturbado do governo João Goulart, e as influências das idéias doutrinárias de Alberto Pasqualini no projeto do governo populista, assim, temos por baliza temporal o período entre 1961 a 1964 e como baliza geográfico-espacial o Brasil. Como aspectos e objetivos secundários, procuramos identificar e cotejar os acontecimentos que levaram às rupturas – sejam parciais ou totais – do governo com a cultura política brasileira e com os grupos sociais envolvidos, comparando algumas visões historiográficas sobre o período do trabalhismo janguista com os principais pensamentos de Pasqualini, identificando a influência do seu idealismo no governo João Goulart, principalmente nos processos de desenvolvimento econômico e reformas sociais progressistas.
Palavras-chave: História política brasileira. Trabalhismo. Alberto Pasqualini.


1. Introdução

O tema escolhido abrange um período conturbado da história brasileira, o governo do presidente João Goulart (1961-1964), no qual pretendemos realizar um breve estudo que não seja apenas uma simples narração dos eventos históricos e políticos, tão pouco queremos encontrar motivações ocultas e suas conseqüências também pouco (ou nem sempre) visíveis, mas sim compreender os aspectos da vida brasileira num de seus momentos de maior tensão, assim, interpretar e cotejar os fatos em uma dinâmica econômica, social e política para melhor compreendermos a relação entre a cultura política brasileira e a doutrina teórica do trabalhismo de Alberto Pasqualini, além da participação dos protagonistas (grupos sociais) deste período histórico, pois o governo João Goulart refletiu o crescimento de lutas entre os grupos sociais, seja para a manutenção de privilégios e exploração, seja para conquistas de direitos políticos e sociais.

Desta forma, é preciso compreender o período do governo de João Goulart (metas, propostas, políticas sociais, etc.) e a instabilidade social e política no Brasil provocada pelo acirramento da luta de classes entre os grupos sociais envolvidos, acelerando a crise e o fim do populismo com o golpe civil e militar, em abril de 1964, investigando qual foi a importância do idealismo de Pasqualini neste período, influenciando nas propostas de Jango e Brizola, pois estes últimos ou são considerados como herdeiros políticos do legado de Vargas (pragmáticos) e Pasqualini (ideólogos) ou são considerados justamente como uma terceira possibilidade de análise, os ideólogos-pragmáticos – correntes internas do PTB.

O objetivo central da investigação é compreender a realidade histórico-social brasileira, no período conturbado do governo João Goulart (1961-1964), e as influências das idéias doutrinárias de Alberto Pasqualini sobre o trabalhismo na formação teórica do partido político, o PTB – Partido Trabalhista Brasileiro (1945), e no projeto do governo populista na (tentativa de) execução da teoria na prática com as reformas de base na fase final do governo populista trabalhista, identificando e cotejando os acontecimentos que levaram às rupturas – sejam parciais ou totais – do governo com a cultura política brasileira e com os grupos sociais envolvidos, comparando algumas visões historiográficas sobre o período do trabalhismo janguista com os principais pensamentos de Alberto Pasqualini, identificando a influência dos ideais de Pasqualini no governo João Goulart, principalmente nos processos de desenvolvimento econômico e reformas sociais progressistas.

Através do auxílio das perspectivas teóricas trabalhadas pela abordagem compreensiva weberiana, queremos construir conhecimento a respeito do tema, a ser abordado no presente trabalho, de forma a nos auxiliar na compreensão da complexidade e da tensão dos grupos sociais envolvidos no período, relacionando a satisfação de suas necessidades materiais com as influências das relações econômicas sobre as instituições sociais do governo João Goulart (organização política), apresentando um breve contexto sobre as origens e o desenvolvimento dos processos que influenciaram o pensamento de Alberto Pasqualini na formação de sua doutrina política em defesa do capitalismo solidarista e do projeto desenvolvimentista do trabalhismo brasileiro, com suas especificidades, na política brasileira.

Quanto à abordagem metodológica, utilizar-se-á do método indutivo como estratégia de construção do texto e como procedimento metodológico será utilizado a forma comparativa. Estas metodologias se tornam necessárias porque o trabalho pretende se revestir de uma forma pedagógica e acadêmica, que, por sua vez, induza o leitor a fazer uma ligação de idéias diante de dados que são analisados de forma comparativa. E, assim, através da comparação historiográfica entre os autores sobre o período, além da consulta e interpretação de fontes primárias (artigos, discursos, documentos, etc.) sobre Alberto Pasqualini, seremos capazes de desvendar e construir um conhecimento científico a partir do tema, contribuindo com conclusões parciais que possibilitem o avanço do objeto de estudo apresentado.

Para elaboração deste artigo, utilizamos como referências principais as duas obras de Simon (1994 e 2004), organizador de importantes coletâneas de documentos produzidos por Alberto Pasqualini durante a sua vida pública, ou seja, fontes primárias fundamentais para a compreensão do pensamento político pasqualista. Além disso, Simon deixa clara a sua posição ao enaltecer as qualidades morais de Pasqualini, sua posição de maior ideólogo do trabalhismo brasileiro e fundador de uma doutrina política econômica e social que antecipou a chamada terceira via, aplicada atualmente pelos trabalhistas britânicos: a social-democracia. Simon, ainda, citou os fatos mais marcantes da biografia de Pasqualini, analisou suas posições sobre os temas dominantes de seu tempo, em especial: a pobreza, a importância da defesa do trabalhador, a desigualdade social, a urgência da reforma agrária e a necessidade de um Estado eficiente e confiável para inspirar cidadania.

O título “Alberto Pasqualini: obra social e política” (1994) são coletâneas de documentos, discursos e idéias do próprio Pasqualini, organizado em quatro volumes pelo então (e atual) senador Pedro Simon, em 1994. A sua outra obra, “Alberto Pasqualini: textos escolhidos”, de 2001, é uma republicação do trabalho/obra de 1994, mas se destacando – entre artigos em jornais, conferências, projetos e pareceres – os textos que pareciam mais significativos ao organizador, ou seja, aqueles que mais impressionavam pela sua vitalidade e atualidade, auxiliando-nos para selecionar as fontes primárias mais significativas para a compreensão dos ideais de Pasqualini, especialmente a respeito do trabalhismo.

A obra “O pensamento político de Alberto Pasqualini” (2005), de Gervásio Neves (Org.), Liana Bach Martins (Org.) e Márcia Eckert Miranda (Org.), é a reunião de quarenta trabalhos de Alberto Pasqualini, buscando confirmar o reconhecimento à importância do conjunto da obra de Pasqualini, auxiliando na compreensão da estruturação da doutrina do trabalhismo brasileiro. Desta forma, cotejando as obras citadas com outras obras a respeito do período do governo João Goulart (1961-64), foi possível elaborar o presente artigo na expectativa de poder contribuir ao estudo deste personagem histórico, fonte de inspiração para grande parte dos políticos gaúchos, e do próprio trabalhismo nas décadas de 1940, 50 e 60.

2. O pensamento político de Alberto Pasqualini

Aqueles que afirmam que, ora nos revelemos capitalistas, ora socialistas, que ora roçamos o comunismo e ora afagamos o espiritualismo cristão, ou não têm, ou fingem não ter, a menor noção dos temas que pretendem discutir, ou ainda, o que é pior, procuram desvirtuar nosso pensamento, falsear as idéias que defendemos, para depois refutá-las.

Nossa posição é clara e definida. Se por socialismo se entender a socialização dos meios de produção, não somos socialistas; se se entender, simplesmente, uma crescente extensão da solidariedade social e uma crescente participação de todos nos benefícios da civilização e da cultura, então somos socialistas.

Da mesma forma, se por capitalismo se entender individualismo, egoísmo e tradicionalismo, não somos capitalistas; se, porém, se entender uma função social que se exerce para o crescente progresso econômico e social da coletividade, então somos capitalistas.

Trabalhismo e capitalismo solidarista são expressões equivalentes porque, no seu conceito, se ressalta o primado do trabalho na produção da riqueza (Correio do Povo, Porto Alegre, 14 de dezembro de 1946).

O trecho acima refere a uma pequena parte do discurso realizado em Caxias do Sul, no encerramento da convenção do PTB, durante campanha para o governo do Estado, local em que Pasqualini expõe com profundidade o essencial da doutrina que abraçou ao longo de sua vida pública – Trabalhismo e capitalismo solidarista –, ao mesmo tempo em que se defende de acusações de cunho ideológico: ora como defensor do capitalismo, ora como defensor do socialismo. Na verdade, Pasqualini defendia que a transformação social e progressista que conduziria a uma sociedade mais justa deveria iniciar-se pelo respeito aos princípios fundamentais de uma sociedade democrática: eleições livres, liberdade de imprensa, partidos bem estruturados, parlamento forte, protegendo os direitos individuais e, principalmente, respeito à livre manifestação de idéias, mesmo as divergentes (SIMON, 1994, v. 1, p. 14-15).

Mas para compreender a obra de Pasqualini, é preciso resgatar uma breve síntese do seu passado. O bacharel Alberto Pasqualini (23.09.1901 a 03.07.1960) foi advogado e professor de Ciências Sociais e Jurídicas na UFRGS (décadas de 1930-40), eleito vereador de Porto Alegre (1935-37), servidor público estadual comissionado no período intervencionista do Estado Novo e senador (1951-55, inclusive sendo o relator do projeto que criou a Petrobrás), duas vezes concorreu ao governo do Estado (1946 e 1954) sem obter êxito e teve na religião católica e no trabalhismo inglês com fontes na formação de sua doutrina política e social. A doutrinação e formação trabalhista estão contidas na sua obra “Bases e sugestões para uma política social”, de 1947, considerado um marco para a consolidação das idéias de Pasqualini a respeito do trabalhismo e do PTB (ABREU, 2001, p. 4437-4438).

Conforme Simon (1994, p. 20-24), amparado pela filosofia cristã e católica, percebe-se a coincidência da visão do seu trabalhismo com os Encíclicos Papais, especialmente a Rerum Novarum, de Leão XIII, e a Quadragesimo Anno, de Pio XI, pregando o humanismo, a solidariedade cristã e o próprio trabalhismo, pois, conforme Pasqualini, a “religião não deve representar uma fuga; deve ser, antes, um princípio e uma norma de ação”. Ele adotou uma posição agnóstica em sua vida pública, mesmo tendo uma família religiosa (católica). Passou a juventude em colégios religiosos, pautou a sua vida de acordo com os mais rígidos preceitos da moral cristã, no entanto, quando esteve no exercício de mandatos e cargos públicos, afirmou não ser adepto de nenhuma religião, ou seja, era um funcionário do Estado e não membro de uma religião, inclusive tomando decisões em contrário aos interesses da Igreja.

A respeito do trabalhismo, antes mesmo de sua criação como partido (1945), naquela época quem tinha preocupação social era comunista e Pasqualini não escapou da acusação – tática política da oposição para incompatibilizá-lo com o eleitorado católico. No entanto, trabalhismo e comunismo eram antagônicos. Os trabalhistas prejudicavam politicamente os comunistas, pois estes estavam interessados na permanência da situação atual para agravar os atritos entre as classes e o povo se convencesse que não há soluções dentro do regime capitalista – ao contrário do trabalhismo pasqualista, com sua visão humanista e cristã do capitalismo, pregando uma cooperação entre as classes e não o acirramento da luta.

Pasqualini combatia a dualidade do discurso, comum na época, que afirmava só haver duas alternativas ou propostas: ser comunista ou capitalista. Ele não era nem um e nem outro ao mesmo tempo em que defendia idéias socialistas e capitalistas. Simon (1994 e 2001) e Neves (2005) concordam que Pasqualini com seu discurso em favor do capitalismo solidarista está muito próximo da social-democracia (a doutrina política dominante hoje em dia nos países ocidentais europeus). O capitalismo solidarista e o trabalhismo de Pasqualini são expressões equivalentes, onde os métodos e soluções não se baseiam na luta de classe, mas na solidariedade entre as classes. No entanto, a burguesia gaúcha reagia à pregação de Pasqualini chamando-o de esquerdista, comunista e ateu, pois ele defendia o acesso fácil dos colonos à posse de terra, além de propor a extensão dos benefícios da legislação trabalhista aos trabalhadores rurais, pois sendo o trabalhismo uma doutrina social, quando aos seus postulados e objetivos humanitários, nada mais justo que propor esse ato de solidarismo, progressista, mas visto com enorme desconfiança pelas elites no período inicial da guerra fria.

Com a polarização entre PTB e PSD no Rio Grande do Sul, com vários movimentos internos num mesmo partido, que são carentes (fragilizados) de ideologia, onde, por exemplo, Getúlio Vargas (entre 1945 e 1950) se destacou com sua atuação ambígua com relação ao trânsito entre PSD e PTB. A chamada “Lei Agamenon”, que traça as normas para a organização de partidos políticos em 1945 (que deverão ter um caráter nacional), tinha por objetivo evitar uma fragmentação política regional federalista ao mesmo tempo em que permite a criação de novos partidos, mas partidos nacionais (fim dos partidos regional-estaduais). Por causa desta lei, a USB (União Social Brasileira), criada por Pasqualini e demais membros em setembro de 1945, defende e apóia o capitalismo solidarista, empreendedor, de sentido social, para todo o Brasil (Correio do Povo, Porto Alegre, 21.09.1945). Posteriormente, ocorrerá a fusão com o PTB, em 1946.

Essa complexa e contraditória rede política gaúcha – e suas alianças – é apresentada minuciosamente por Bodea em sua obra (1992), fundamental para entendermos a evolução política rio-grandense, com ênfase no PTB e nos discursos dos seus principais políticos, no período posterior a 1947 até 1954, com a morte de Vargas e segunda derrota de Pasqualini ao governo do Estado, marcando o fim de uma fase do trabalhismo gaúcho e brasileiro. Na visão de Pasqualini, o trabalhismo é uma ideologia, um sistema político e social, e não um projeto pessoal de um líder – o queremismo é uma atitude sentimental em relação a Getúlio Vargas, ou seja, um movimento pela continuidade ou retorno de Vargas ao poder.

Bodea (1992, p. 58-60) apresentou a formação e o desenvolvimento do PTB no Rio Grande do Sul – que se destacou não só por ser a seção estadual mais organizada e berço político de Vargas, mas também pela contribuição teórica doutrinária de Alberto Pasqualini com seu objetivo de transformar o capitalismo individualista em capitalismo solidarista, com uma socialização parcial do lucro – para melhor compreensão do projeto do trabalhismo a nível nacional.

É uma visão regional sobre o relacionamento político entre Vargas e Pasqualini, destacando com detalhes as diferenças (não no sentido de rivalidade) e semelhanças entre ambos, com Vargas e seu projeto político nacional (ele era uma liderança política nacional, estadista e um grande estrategista político) e Pasqualini com seu projeto de construção do PTB gaúcho (é a liderança política regional), um exímio doutrinador e teórico, visando à extensão do projeto trabalhista para nível nacional.

Percebemos, ainda, que o PTB surgirá como um partido popular (inicialmente sindicalista), mas após haverá a evolução/avanço do PTB com a inclusão dos pragmáticos-getulistas (oriundos do PSD) e dos intelectuais da corrente-ideológica (a parte intelectual do partido, formada por acadêmicos e profissionais liberais ex-integrantes da USB), sendo que estes vão absorver a antiga corrente-sindicalista, abrindo espaço para a criação de uma corrente ideológica-pragmática, ambígua entre a orientação teórica de Pasqualini e a liderança de Getúlio Vargas. (BODEA, 1992, p. 60).

Nestas diferenças, na verdade, conforme Bodea, existe um entrosamento (mesmo que em conflito) entre as duas lideranças, com o casamento do projeto nacional de Vargas e o reformismo social de Pasqualini com sua proposta de capitalismo solidarista, com destaque para o fato de que ambos defendem a questão da intervenção do Estado na economia como forma de regulação econômica em favor do progresso e do social.

No entanto, percebemos que no artigo “Ditaduras” (Correio do Povo, Porto Alegre, 11.07.1943) o próprio Pasqualini criticava a concentração de poder e os tipos de autoridades na ausência da separação ente o poder e o seu detentor, pois a complexidade e amplitude dos problemas sociais, políticos econômicos e administrativos do Estado moderno exigem que o poder seja compartilhado e não concentrado nas mãos de um só homem, mesmo sendo (pretensamente) o mais inteligente, o mais capaz. É uma crítica direta ao Estado Novo e a personificação de Vargas, algo combatido por ele mais adiante na formação do PTB, conforme as fontes primárias apresentadas nas obras de Simon (1994 e 2001), Neves (2005) e do próprio Pasqualini no conjunto de sua obra nas décadas de 1930, 40 e 50.

Conforme Simon, Pasqualini também percebeu e defendeu que o PTB não poderia e nem deveria depender apenas do carisma de Getúlio Vargas, ou seja, a defesa do trabalhador através de simples remédios jurídicos: proteção ao trabalho e ao salário, sem alterar as relações de produção. O PTB, na verdade, deveria sim se transformar em um partido de idéias, em prol de uma linha política em defesa da submissão dos interesses privados aos interesses da coletividade, ou seja, uma posição intermediária entre o capitalismo e o socialismo, pois os que lutam por idéias estão preocupados com a realização do seu ideal, uma vez no exercício de um mandato o servidor público deveria assumir atitudes políticas, ou seja, atender os cidadãos, sem fazer distinção entre ideologias ou credos, preferências eleitorais ou partidos, portanto, devendo defender não uma ou outra corrente partidária, mas os interesses da coletividade – respeitando as diferenças entre o público e privado (1994, p. 52).

3. A influência da corrente-ideológica trabalhista no governo João Goulart

O professor deve, principalmente, educar a juventude no sentido de desenvolver nelas as idéias e os sentimentos de solidariedade social e de fraternidade humana. Só assim poderemos preparar gerações onde os problemas e as desigualdades sociais não atinjam as asperezas da hora presente. [...] sem a ação do professor nenhuma obra coletiva duradoura será possível porque lhe faltarão as bases psicológicas. Eis que o professorado deve necessariamente formar a vanguarda do progresso moral da sociedade (Correio do Povo, Porto Alegre, 27 de novembro de 1947).

Percebemos que, para Pasqualini, o trabalhismo apenas se aproximaria do socialismo como uma forma de crescente extensão da solidariedade social e participação de todos nos benefícios da civilização. Por outro lado, também se aproximaria do capitalismo no sentido de exercer um crescente progresso econômico e social da coletividade, ou seja, a idéia de que o mundo poderia avançar gradualmente, progressivamente, com transformações constantes e conscientes. O PTB era o instrumento fundamental, privilegiado e exclusivo de realização das reformas sociais para chegar ao solidarismo. Porém, na sua visão, o partido deveria preocupar-se não só em ganhar eleições, mas sim em criar uma conscientização na sociedade civil para realizar um amplo programa de transformações sociais, mesmo que para isso devesse privilegiar os métodos democráticos para chegar ao poder.

No entanto, mesmo no poder com Vargas (1951-54) e posteriormente com Jango (1961-64), os ideais do trabalhismo nacional apresentavam-se diferentes do idealismo de Pasqualini, pois é o período do populismo (e em fase de crise), mas algumas características podem ser levantadas para o debate, especialmente no governo Jango – identificado como adepto da corrente ideológica-pragmática do PTB, ou seja, ambígua entre a orientação teórica e doutrinária (idealismo) de Pasqualini e o pragmatismo pela sociedade política (mas agora sem a sombra de Vargas e de seu aparato instrumental eleitoral).

Conforme Weffort, o termo populismo, no caso brasileiro, é normalmente associado ao autoritarismo paternalista ou carismático dos líderes de massas da democracia pós-guerra (1945-64), mas também é a expressão mais completa da emergência das classes populares durante um período de desenvolvimento urbano e industrial, ou seja, a incorporação das massas ao jogo político. Em síntese, é um projeto em conjunto, onde a figura do Estado apresenta-se como conciliador, mas a serviço do capitalismo, da industrialização e manutenção da ordem vigente, o chefe de estado era o árbitro, o que lhe garantia força pessoal, confundindo-se com o próprio Estado, “entre o amor ao povo e o amor ao poder” (WEFFORT, 2003, p. 61-63).

Em suas obras, Toledo (1997) e Fausto (2003) recapitulam as características básicas entre 1961 e 1964, referindo-se a crescente e intensa crise financeira (herança do governo JK), constantes crises institucionais, as classes populares agindo por conta própria, as reivindicações das ligas camponesas pela extensão dos direitos trabalhistas, existência de organizações atuantes (diversidade política) e uma classe média organizada politicamente. Jango assume após a renúncia de Jânio Quadros e a Campanha da Legalidade promovida no Rio Grande do Sul (agosto de 1961), período de agitações e perturbações que quase levaram a uma eminente guerra civil, mas um acordo inconstitucional permitiu a adoção do sistema parlamentarista, híbrido, com Tancredo Neves como primeiro ministro, até o plebiscito de 1963 que confirmou o retorno do presidencialismo. Mas todo este processo consumiu quase um ano e meio do governo Jango, que praticamente não conseguiu governar conforme seu plano de governo.

Após o retorno do presidencialismo, Jango, por exemplo, adotando idéias de Pasqualini, propôs que vários imóveis (alugados) poderiam ser adquiridos em definitivo pelos inquilinos, seja pelo financiamento ou desapropriação, algo que assustou a classe média proprietária. Assustou também as estruturas do campo com a promessa de fazer a reforma agrária. É a época do auge da guerra fria (EUA x URSS), assim, o medo era grande por causa da chamada “república sindicalista”, ou seja, adotar os modelos cubanos, chineses ou soviéticos. Mas, assim como Pasqualini, Jango não era um revolucionário, pelo contrário, na verdade ele pretendia fazer as reformas com terras e imóveis devolutas, ou seja, que já pertenciam ao governo, sem prejudicar os proprietários ou latifundiários. Ele tinha que articular (e sofrer pressões) com as forças armadas nacionalistas, burguesia industrial nacional, classe operária, intelectuais do governo, etc., enfim, a situação não era fácil.

Devido essas pressões, Toledo (1997) lembra que foi elaborado o Plano Trienal, ou seja, o povo deveria apertar o cinto. Era um plano conciliador (populista) que tinha por objetivo manter as taxas de crescimento da economia e reduzir a inflação (agradar as classes trabalhadoras), além da promessa da retomada do projeto desenvolvimentista, ou seja, visando o desenvolvimento para retomar as taxas de crescimento dos anos 1950. Assim, este projeto político deveria recuperar a economia e preparar a imagem política do próprio Jango (ou dos líderes trabalhistas, como Brizola) para o futuro.

No entanto, este Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico e Social, elaborado pelo ministro do planejamento Celso Furtado, também atendia as condições exigidas pelo FMI, ou seja, indispensáveis para a obtenção de novos empréstimos e para a renegociação da dívida externa. O Plano Trienal também determinou a realização das chamadas reformas de base: reforma agrária, fiscal, educacional, bancária, eleitoral, entre outras. Para o governo janguista, elas eram necessárias ao desenvolvimento de um “capitalismo nacional” e “progressista”.

Neste ponto destacamos as influências doutrinárias de Pasqualini no governo de João Goulart, pois o idealismo de Pasqualini representava uma consciência de que, para aqueles que sentem e compreendem as responsabilidades do Governo, não é a derrota eleitoral mas sim a vitória que poderá preocupar (SIMON, 1994, p. 30). Esse pensamento justificava a sua preferência pelos idealistas ao invés dos pragmáticos e oportunistas, visto que

Onde não existe idealismo, onde a atividade pública não é um ato de renúncia, de desprendimento e quase uma missão apostolar, o poder político se tornará sempre o monopólio de corrilhos, de grupos econômicos, um jogo do mercantilismo e da aventura. E então os órgãos [...] existirão apenas para defender interesses pessoais, proteger apadrinhados e enriquecer os especuladores (Diário de Notícias, Porto Alegre, 06 03.1951).

Na verdade, este debate envolvia questões pelo aspecto doutrinário e institucional, pois a idéia de reforma de base era uma visão trabalhista, que levaria à reformulação da sociedade. Pasqualini reafirmou sua posição no Senado no início da década de 1950, com diversos discursos a respeito do tema, realmente com uma visão mais doutrinária do que política, mais equilibrada do que eleitoral, enfim, evitando a ambigüidade dos pragmáticos.

Desta forma, Jango tenta compor um bloco de poder com os interesses agroindustriais nacionais, não comprometidos com o capital estrangeiro, apoiado pelos trabalhadores da cidade e também do campo. As reformas de base, o seu plano de governo, tinham como objetivo atingir os interesses das empresas multinacionais, através da lei que restringe a remessa de lucro às suas matrizes visando impedir a saída maciça de capitais para o exterior, ou seja, como desejava Pasqualini, o capitalismo deveria ter uma “função social que se exerce para o crescente progresso econômico e social da coletividade”, assim deveria ser empreendedor, almejando o lucro, mas de sentido social na repartição deste lucro e atendendo os anseios da classe trabalhadora. Pasqualini, nacionalista convicto, não possuía preconceitos com o capital estrangeiro, mas acreditava que este deveria aceitar e correr os riscos e repartir os lucros com o Estado, de maneira honrada, livre e dentro da lei.

Outro ponto a se destacar, sobre as reformas de base, era a questão até então inquestionável: o latifúndio. Jango oferecia propostas (ainda que tímidas, como já foi citado) de reforma agrária. O próprio Pasqualini, em 1945, já defendia a criação de colônias agrícolas como solução à concentração da propriedade rural e em benefício dos trabalhadores sem terra. Seria através da justiça social a forma de repartir os benefícios da civilização, ou seja, dos frutos e benefícios da cultura e da civilização, assim como o uso e gozo dos bens da terra (SIMON, 1994, p. 13). Pasqualini em 1949 já ensinava que

Distribuir melhor a propriedade de terra não significa socializá-la. A propriedade da terra deve estar sempre condicionada ao seu melhor uso. É preciso não esquecer que a terra não pode ser aumentada nem diminuída. Existe, em extensão limitada, de onde a necessidade de ser bem aproveitada do ponto de vista econômico e social (Diário de Notícias, Porto Alegre, 10.12.1949).

Na área trabalhista, as reformas de base apresentavam reajustes reais de salários e uma política de controle de preços dos bens básicos de consumo, ou seja, um dos itens da função social do capitalismo solidarista que Pasqualini defendia arduamente. Assim como uma reforma bancária, para possibilitar crédito fácil e acessível à população, especialmente quem trabalhava no campo, e também porque a manobra especulativa deveria ser combatida, por ser anti-social e anti-econômica. É anti-social porque obriga o consumidor a pagar lucros de intermediários não razoáveis e anti-econômica porque desorganizava os mercados e a população. Pasqualini considerava imprescindível a intervenção do Estado na esfera econômica, quer para superar as deficiências da iniciativa privada, quer para corrigir suas anomalias, justamente pensando na coletividade e solidariedade (SIMON, 1994, p. 52).

Outro item importante é a reforma educacional, pois Pasqualini já alertava que

Não haverá transformações sociais estáveis e duradouras se não se formar, ao mesmo tempo, o caráter do homem. O que é necessário, por isso, é educá-lo [...]. Educar é ensinar a compreender, a sentir e a reagir. Educar é formar convicções. Para que possa haver educação é necessário, pois, antes de tudo, que haja liberdade de pensamento e de sua expressão. (SIMON, 1994, p. 13-14)

Em matéria de ensino, estamos atrasados, pelo menos, dois séculos.
[...]
Nosso País jamais poderá industrializar-se, jamais poderá atingir o nível de civilização das grandes nações, enquanto o ensino, de um lado se limitar à alfabetização e, de outro, a fabricar doutores, em regime, aliás, de produção do tipo inferior (Correio do Povo, Porto Alegre, 25.02.1942).

Portanto, nas reformas de base, as principais propostas de Jango já estavam no discurso de Pasqualini em 30.08.1951, no Senado, onde o então senador defendia as reformas de base, criticando o clientelismo político e o empreguismo promovido na administração pública pelos partidos que estão no poder. Originalmente, na visão materialista, o Estado foi criado a serviço dos grupos sociais mais ricos e poderosos (elites), no entanto, percebemos no discurso de Pasqualini o Estado como uma instituição com função social, a serviço de todos, para evitar que os grupos mais poderosos dominassem, pela violência e tradição, os grupos mais humildes. Ou seja, o Estado não poderia ser apenas um guardião da tranqüilidade pública (visão liberal), policial, mas sim deveria dar a todos o mesmo ponto de partida, pela educação universal, e que atenue as diferenças sociais com os equipamentos comuns de saúde e os recursos do crédito, conforme defendeu Pasqualini no discurso de 23.11.1951, no Senado.

Esta perspectiva reformista era influenciada pelo trabalhismo inglês, mas Pasqualini em seus documentos várias vezes reiterava que o trabalhismo brasileiro possuía suas especificidades pelo fato do Brasil não estar no estágio dos países capitalistas modernos: legal e racional – um estado moderno e racional, legitimado pela lei, ou seja, o líder deve passar por processos legais de nomeação, pelo voto e com eleições livres e democráticas.

No entanto, o anúncio destas reformas, baseadas no idealismo de Pasqualini, aumentou a oposição ao governo e acentuou a polarização da sociedade brasileira. Jango perdeu rapidamente suas bases de apoio na burguesia. Para evitar o isolamento político, reforçou as alianças com as correntes reformistas e de esquerda, da UNE (União Nacional dos Estudantes) e até mesmo do Partido Comunista Brasileiro, que, embora na ilegalidade, mantinha forte atuação nos movimentos popular e sindical. Mas devido às repercussões negativas, tanto por parte da burguesia (medo das transformações progressistas e sociais) e por parte dos grupos sociais mais humildes (apertar o cinto!), o Plano Trienal foi abandonado em meados de 1963. Entretanto, Jango continuou a implementar medidas de caráter nacionalista, finalmente limitando a remessa de capital para o exterior, nacionalizando empresas de comunicação e decidindo pela revisão das concessões para exploração de minérios. As retaliações estrangeiras foram rápidas: governo e empresas privadas norte-americanas cortaram o crédito para o Brasil e interromperam a renegociação da dívida externa (BANDEIRA, 1978, p. 110-112).

Conforme Bandeira, as tradições políticas impregnam uma sociedade, constituem uma cultura, um tecido difícil de rasgar e “jogar no lixo”. Não adianta separá-las e amordaçá-las porque, nos momentos mais imprevistos, elas voltam a incomodar. Impossível fazer política sem partir delas, o que não quer dizer que é preciso se conformar passivamente com sua tradição, mas que devem ser bem analisadas as ações devido suas complexidades e resultados futuros (1978, p. 131). Jango, no entanto, sem apoio do Congresso (que negou suas solicitações) e da burguesia, optou por abraçar incondicionalmente as reformas de base no início de 1964, independente do Congresso, buscando apoio direto das massas (FICO, 2004, p. 17).

Isto criou um clima insustentável, ao qual Ianni escreve dizendo ser “o colapso do populismo”, pois se o discurso em favor do nacionalismo era muito forte, a dependência do capital estrangeiro era muito grande também. Ao mesmo tempo em que a esquerda apoiava o governo, a burguesia até pouco tempo também estava ao lado de um projeto que mantinha a hegemonia das classes dominantes. Com o acirramento das relações no governo de Jango, mas que Ianni lembra haver opções (acusa Jango de omisso e fraco), nada é feito para evitar o golpe civil-militar que estava sendo arquitetado, pois o caminho escolhido a favor da esquerda mais radical, discurso reformista e amplamente apoiado pelo proletariado, voltado para as reformas de base, é insuficiente para garantir o apoio que necessitava para evitar o golpe. Ou seja, ocorreu uma sucessão de erros políticos, mas a conjuntura já indicava/apontava para o golpe, este contendo com um discurso reacionário e largamente apoiado pela classe média, voltado para com as tradições políticas brasileiras (autoritarismo) (1988, p. 116-117).

Desta forma, justifica-se que março de 1964 é um episódio da guerra fria e que o objetivo apresentado pelos militares é a restauração da legalidade, restabelecer a federação, eliminar o plano comunista da posse do poder em desenvolvimento (teoria do contragolpe), defender as instituições militares que começavam a serem destruídas e estabelecer a ordem para o advento das reformas legais (SILVA, 1975, p. 34).

A corrente da historiografia que defende a Revolução de 1964 alega ter sido necessário o movimento por causa dos distúrbios sociais, agitações sindicais, desequilíbrio econômico, insegurança política e inflação elevada, além de que, conforme a obra de Figueiredo (1970, p. 104-154), entre 1961 e 1964, no contexto da radicalização das lutas sociais, emergiu novamente, entre os comunistas, tendências radicais favoráveis ao enfrentamento armado.

No interior do trabalhismo e no interior de todas as demais correntes populares formou-se com força considerável a idéia de que as classes e elites dominantes no país não abririam mão de seus privilégios, ou seja, que seria preciso arrancar as reformas de base à força. Um slogan sintetizou esta perspectiva: “reforma agrária na lei ou na marra”. Seus partidários, na prática, já não acreditavam que seria possível conseguir as reformas nos quadros da legalidade e passaram a advogar o confronto (e se fosse necessário, com armas nas mãos) como via para a realização do programa nacional-estatista. Baseando-se em tais justificativas, Figueiredo (1970) afirma em sua obra que se fez necessário a revolução, o contragolpe.

Carlos Fico (2004), especialista em historiografia, procura identificar o repertório de temas, problemas e debates sobre o golpe e o regime abordados pela historiografia brasileira, sobretudo nos elementos centrais para o golpe de 1964. O seu artigo se propõe aos principais elementos de debate sobre este recorte e, através de um conjunto de obras, fazer uma reflexão teórica (criticidade) dos trabalhos existentes.

Assim, constatamos principalmente nas obras de Bandeira (1978), Fausto (2003), Fico (2004), Ianni (1988), Toledo (1982 e 1997) e Weffort (2003), de caráter mais científico e com embasamentos e argumentações que achamos mais pertinentes, que os argumentos da corrente historiográfica em favor da Revolução de 1964, embora nem sempre inverídicos (mas, em muitos casos, amplamente distorcidos e aproveitando-se do clima da “guerra fria” entre EUA e URSS), foram utilizadas para justificar o golpe civil-militar de 1964 e, posteriormente, o governo militar nas décadas de 1960 e 1970, como forma de manutenção do poder pelos grupos sociais conservadores e evitar possíveis processos reformistas e progressistas (conforme o idealismo de Pasqualini), aproveitando-se da crise (colapso) do populismo que, ao mesmo tempo em que pretendia atender aos grupos sociais da cidade e do campo, também visava a consolidação e permanência no poder, nem que fosse através de ações autoritárias e indo de encontro aos interesses da burguesia.

A luta de classes chegou ao ápice no governo de João Goulart, quando foi necessário escolher um caminho e quebrar a harmonia entre as classes, fazendo, assim, o populismo perder o seu caráter dúbio e pragmático, adotando talvez de forma literal um idealismo defendido por Pasqualini, mas de forma incorreta (radicalismo) e com as conseqüências não calculadas, num momento problemático e de crise.

Portanto, é correto afirmar que a ditadura militar quis varrer com essas “novas tradições”, particularmente com o trabalhismo e com o programa nacional-estatista, vistos como expressão e legado da era Vargas, mas que, na verdade, possuía em seu conteúdo grande parte dos ideais de Pasqualini.

4. Conclusões

Num primeiro momento, destacamos que o problema que originou este artigo foi a compreensão da realidade histórico-social brasileira, no período conturbado do governo João Goulart (1961-64), e as influências das idéias doutrinárias de Alberto Pasqualini no projeto neste governo populista, apontando as origens e o desenvolvimento dos processos que influenciaram o pensamento de Alberto Pasqualini na formação de sua doutrina política em defesa do capitalismo solidarista e do projeto desenvolvimentista do trabalhismo brasileiro, com suas especificidades, na política brasileira.

Posteriormente, identificamos e comparamos os acontecimentos que levaram às rupturas – sejam parciais ou totais – do governo de Jango com a cultura política brasileira e com os grupos sociais envolvidos, apresentando os principais pensamentos de Pasqualini e identificando a influência do seu idealismo nos processos de desenvolvimento econômico e de reformas sociais progressistas, comparando as principais propostas do projeto de reformas de bases do governo janguista com os textos de Pasqualini nas décadas de 1930, 40 e 50.

Com o decorrer do texto, percebemos e apontamos os objetivos políticos de Pasqualini, preocupando-se com os aspectos políticos como função social e visando a educação das massas como forma de almejar e atingir uma consciência política para as reformas sociais necessárias. Constatamos também que Pasqualini defendia que o partido deveria adotar um programa de reformas ou transformações sociais, mas que só se manteria no poder e conseguiria seus objetivos através de uma ampla base de penetração e organização na sociedade civil, através da educação das massas para a devida conscientização e participação popular na política, caso contrário, faltaria a sustentação e apoio em momentos cruciais, justamente como correu logo adiante com os próprios trabalhistas no golpe civil-militar de 1964.

Os resultados obtidos neste breve trabalho são parciais e insuficientes para uma análise mais detalhada sobre a influência do idealismo de Pasqualini no governo de João Goulart (1961-64), no entanto, acreditamos que são informações e conclusões importantes que podem auxiliar na realização de uma pesquisa mais detalhada, almejando dados mais específicos e concretos que possam avançar neste estudo ou expandir o recorte (objeto de pesquisa), por exemplo, questionar se golpe militar era inevitável, se foi realizado por causa do esgotamento do populismo ou por causa da interrupção do projeto populista em sua nova fase, agora sim adotando ou incorporando com mais ênfase o idealismo da corrente ideológica de Pasqualini para o cenário nacional, pois Jango e Brizola, após romper com determinados grupos sociais que os apoiavam, abraçaram as classes operárias, os mais humildes, os grupos nacionalistas, conforme a visão do capitalismo solidarista, almejando um processo reformista para a realização da transformação social e do desenvolvimento nacional.

Por fim, lembramos de uma entrevista de 18.03.1949, no Diário de Notícias, quando Pasqualini foi questionado a respeito de sua atuação como teórico do trabalhismo brasileiro, com um discurso diferente dos demais políticos, ao qual respondeu afirmando que “[...] o maior título para um homem público será o de que o pensamento e o sentido social dos seus atos, realizações e atitudes possam ultrapassar-lhe a existência material”.

Referências

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WEFFORT, Francisco C. O populismo na política brasileira. 5. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003. 206 p.

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Sumário da Edição
Número 01

Tema da edição:
História do Brasil Contemporâneo