Somente no século XX o Reino de Sião passaria a se chamar Tailândia. Foto acima, antigo templo budista siamês.
História Livre - História Contemporânea - História
Asiática
O
IMPERIALISMO EUROPEU NO REINO DE SIÃO
Marcos
Emílio Ekman Faber, Juliana Passor, Vanessa Passos e Antenor Adorne Filho
Orientador: Dr. André Luis Reis da Silva
Resumo
O presente artigo analisa o imperialismo europeu
do século XIX no reino de Sião,
através da análise histórica
bibliográfica e de uma análise
comparativa desta com a apresentada pelo filme
Anna e o Rei. Nossa análise estará
focada na teoria do desenvolvimento desigual
e combinado de Trotski. Palavras Chave: Reino
de Sião, Anna e o Rei, desenvolvimento
desigual e combinado, Tailândia, Imperialismo,
Colonialismo.
Introdução
O colonialismo europeu na Ásia é
de suma importância para compreendermos
a
formação dos Estados do extremo
oriente e sudeste asiático. Neste artigo
nos deteremos na análise histórica
do antigo Reino de Sião, local onde hoje
fica a Tailândia. Faremos uma análise
do Sião no período auge do colonialismo
europeu no sudeste-asiático (séc.
XIX), e analisaremos comparativamente o Sião
histórico com o reino siamês abordado
no filme hollywoodiano “Ana e o Rei”; baseado
nas memórias da inglesa Anna Leonowens,
viúva de um militar inglês que
residia na Índia colonizada pelos britânicos.
O filme é baseado nas impressões
desta senhora sobre a corte, os costumes e a
vida dos siameses.
O Sião Histórico
Antes de analisarmos o filme é importante
situarmos o fundo histórico em que este
está inserido. O filme se passa durante
o reinado de Mongkut, ou Rama IV, que reinou
de 1851 até 1868. Sião era uma
das poucas monarquias autônomas da região
na época, e o reino tinha sua base econômica
tributária com comércio de longa
distância. Além de comercializar
com outros reinos da região, o Sião
mantinha relações comerciais com
países da Europa.
Panikkar aponta que o desenvolvimento econômico
siamês não pode ser comparado ao
modelo europeu, porém os siameses souberam
inserir-se neste jogo político-econômico. A modernização do Sião
deveu-se a maleabilidade siamesa em suas políticas
internacionais. Os portos siameses tornam-se
importantes pontos de comércio, por onde
escoavam mercadorias para todo o oriente, principalmente
para China e Japão. O comércio
de longa distância favoreceu grandemente
ao Sião, atraindo o interesse dos europeus
na região.
Para compreendermos melhor o momento histórico
abordado no filme “Anna e o
Rei”, é necessário voltarmos no
tempo e entendermos como ocorreram os primeiros
contatos entre siameses e europeus, e como foram
construídos seus primeiros contratos
comerciais.
O primeiro contato dos siameses com a Europa
ocorreu no século XVI com a chegada dos
portugueses ao oriente. Rama Thibodi II (1491
a 1529) foi o primeiro rei que estreitou relações
com os europeus. Por meio de um tratado cedeu
permissão aos portugueses de residirem
nas cidades de Ayuthaia, Tenasserim, Mergui,
Patani e Licor, por volta de 1516. Os portugueses
logo ficaram bastante impressionados com as
riquezas do país e trataram de forjar
laços comerciais com Sião, que
perdurariam até o século XVIII,
quando outras nações européias
fixariam embaixadas no local. Os portugueses
fizeram de Sião e da sua capital Ayuthaia
(Odiá para os portugueses) sua base de
comércio principal na região,
apesar de terem tentado criar alianças
com os birmaneses, porém sem sucesso,
pois estes eram inimigos dos siameses.
Em 1569 os birmaneses invadem o Reino de Sião,
ocupando a capital Ayuthaia. Esta ocupação
dura pouco tempo e o Sião reconquista
sua autonomia com a vitória sobre os
birmaneses. O general Narasuan lidera os exércitos
siameses na expulsão do invasor e é
coroado como rei Naresuan. Este novo rei faz
do Reino de Sião o mais centralizador
e eficaz estado do sudeste asiático,
reativando o comércio de longa distância
com nações da região e
de fora da Ásia. Nesta época havia
muitos portugueses residindo no Sião
e muitos trabalhando no palácio, até
mesmo no exército siamês. Muitos
haviam lutado contra os birmaneses, fato este
que fez com que recebessem honrarias do rei
Naresuan. Também havia missionários
católicos de origem portuguesa no país,
que fundaram igrejas e templos e levavam muitos
siameses a um aculturamento das tradições
religiosas européias. “Havia muitos cristãos
entre os siameses nesta época e os religiosos
católicos eram bem vistos pelo rei. Essa
tolerância religiosa concedida aos católicos
facilitou o tratado comercial que o rei Naresuan
firmou com a Espanha católica em 1598”.
(VILLIERS, 1976).
Villiers relata que com o fortalecimento do
reino siamês, outras nações
européias demonstraram interesse em comercializar
com o Sião. Ingleses, holandeses e franceses
chegaram ao país para com ele negociar
e obter o máximo de vantagens possíveis.
O auge deste assédio ocorreu no século
XVII, quando o rei francês Luís
XIV tentou instalar no país uma missão
diplomática religiosa que visava contar
com a simpatia dos siameses; a missão
fracassou e os franceses viram-se obrigados
a deixar o país.
O autor continua informando que o interesse
dos europeus pelo comércio com o Sião,
cujos portos constituíam excelentes mercados
para os produtos chineses e japoneses (que tinham
grande demanda no ocidente), associado à
tolerância siamesa com a intervenção
européia e os estabelecimentos estrangeiros,
fizeram que as relações do Sião
e dos Estados europeus fossem geralmente cordiais
e vantajosas “para ambas às partes” (VILLIERS,
1976:167).
“Em 1608, o rei Ekathotsarot, sucessor de Naresuan,
enviou uma embaixada ao
príncipe Mauricio de Nassau” (VILLIERS,
1976). O sucessor de Ekathotsarot, rei
Songtham, estendeu aos ingleses suas relações
com os europeus. Por volta de 1612 foi outorgada
permissão aos ingleses para estabelecer-se
em Ayuthaia e Patani.
Segundo Villiers (1976), em 1664 os holandeses
conseguiram obrigar os siameses, mediante o
bloqueio do Menan, a outorgar-lhes o monopólio
do comércio do couro e o privilégio
de direitos extraterritoriais. Os franceses,
a exceção dos portugueses, haviam
enviado missionários ao Sião em
1622. Desta forma, criaram esperanças
de uma conversão geral dos siameses ao
catolicismo. Em 1680 se estabeleceu em Ayunthaia
à Companhia Francesa das Índias
Orientais, e depois em 1686 se firmou um tratado
que dava consideráveis concessões
comerciais aos franceses e outro religioso privilegiando
seus missionários jesuítas. Essa
política de mostrar favor à companhia
de Jesus e aos interesses franceses foi arranjada
por Constantine Phaulkon, um grego que havia
chegado ao Sião em 1675, alcançado
uma posição de considerável
influência como superintendente do comércio
exterior siamês. A atitude de Phaulkon,
assim como sua presença na corte, contrariava
o grupo formado pelos nacionalistas de Ayuthaia,
comandado por Phra Phetaja, irmão adotivo
do rei Songtham, que tratava de lutar contra
toda influencia estrangeira. Com a doença
de seu irmão e sua nomeação
como regente, Phetaja manda executar imediatamente
a Phaulkon e expulsa os franceses de Bangkok.
Junto a eles jesuítas também foram
expulsos.
“Sendo nomeado rei, Phra Phetaja, inicia com
uma política de hostilidade contra
todos os europeus, principalmente os franceses”
(VILLIERS, 1976). O rei expulsa as tropas francesas
e, a exemplo do que já fizera em Bangkok,
acaba com todos os privilégios dos jesuítas
no Sião. Este período é
conhecido como a Revolução Siamesa
que resulta na expulsão de religiosos
cristãos do país e a adoção
do budismo como religião oficial do Estado.
Esta foi sem dúvida uma medida de fortalecimento
do Estado em detrimento da influência
européia no país. Com a ascensão
budista, o Sião passou a sofrer a influência
destes religiosos não só na espiritualidade
e na moral, mas também na política
e em questões econômicas. Esta
interferência religiosa na política
e na economia acabou por enfraquecer o Estado,
principalmente com as revoltas separatistas
no sul que era islâmico. Aproveitando-se
desta instabilidade os birmaneses voltaram a
atacar em 1767, dominam novamente a capital
Ayuthaia que é saqueada e destruída.
Mesmo com a expulsão das ordens católicas,
muitos portugueses que ainda residiam no Sião
lutaram contra os birmaneses junto com a resistência
siamesa.
Segundo Villiers (1976) no final do século
XVIII o Reino de Sião levanta-se da ruína
ao expulsar o invasor birmanês. Taksin,
general de origem thai, que comandou a expulsão
do invasor, auto proclamou-se rei de Sião.
Taksin muda a capital do país para a
cidade de Thonburi, cidade próxima a
Bangkok, porém intrigas palacianas levam
ao assassinato de Taksin. Chakri, outro general
de origem thai, ascende ao trono siamês,
funda A dinastia Chakri e muda seu nome para
Rama I. Chakri governa o Sião até
sua morte em 1809. Entre muitos feitos cabe
destacar que Rama I foi o fundador da cidade
Bangkok, para onde transferiu a capital do reino.
Rama I reata acordos comerciais com as nações
européias, sobretudo com Portugal que
logo envia embaixadores para Bangkok. O cônsul
português Carlos Manuel da Silveira chega
a Bangkok em 1819 e funda uma feitoria portuguesa
no Sião, porém a constante instabilidade
econômica e política portuguesa
levam a feitoria a fracassar. Além de
problemas na Europa os portugueses estão
enfrentando a terrível concorrência
inglesa na região, principalmente de
Hong Kong sobre Macau. A preocupação
portuguesa agora esta mais centrada no re-equilíbrio
econômico de Macau.
Com o passar do tempo ingleses e holandeses,
além de chineses e norte-americanos,
fundam consulados no país e passam a
comercializar com Sião. A presença
portuguesa agora é apenas uma sobra às
outras nações.
“Rama II, que o sucede o pai no trono do Sião
em 1809, retoma as relações
comerciais com os europeus que desde o final
do séc XVII haviam estado virtualmente
excluídos do Sião, entre eles
Portugal e Inglaterra, este último teve
seu comércio aumentado gradualmente.”
(VILLIERS, 1976).
É neste contexto que a Inglaterra surge
como a grande parceira comercial para o Reino
de Sião. Por mais que isto possa parecer
uma contradição, a autonomia política
siamesa estava associada a sua dependência
econômica da Inglaterra. Com a ascensão
ao poder do déspota esclarecido Mongkut,
Rama IV, o Sião vive seu momento de auge
comercial com os europeus. É neste momento
que chega ao Sião a professora inglesa
Anna Leonowens.
Anna e o Rei
A partir do século XIX, a influência
européia aumenta ainda mais, principalmente
com os reis Rama III (1824–1851) e Mongkut ou
Rama IV (1851–1868). Durante esse período
o Reino do Sião saiu do isolamento que
estava desde a Revolução Siamesa.
Este reavivamento se deu devido em grande parte
ao rei Mongkut, homem muito culto, instruído
nas línguas européias e na ciência
ocidental. Foi ele quem incentivou a modernização
do Estado siamês.
Segundo Villiers, o Sião foi um estado
isolacionista desde o episódio do assassinato
de Phaulkon no final do século XVII.
Os mercadores chineses encorajaram essa política
isolacionista para manter fora os concorrentes,
mas eventualmente a Europa abria as portas do
Sião. Tratados assinados com a Inglaterra
em 1826 e com os norte-americanos em 1833 permitiram
missionários protestantes e um pequeno
montante de comércio dentro do país.
Mais importante foi o tratado assinado com os
ingleses em 1855, que lhes deu extraterritoriedade
e status de nação mais favorecida
à Inglaterra. O tratado deu aos britânicos
o direito de vender mercadorias siamesas, arrendar
terras, construir casas e viajar até
um dia de distância de Bangkok. Outras
potências também demandaram acordos
similares. O rei Mongkut via na rivalidade entre
os poderes estrangeiros o melhor modo de proteger
seu país da influência exacerbada
de algum deles. Este fato fica muito claro no
filme quando Mongkut reúne-se separadamente
com diplomatas ingleses e franceses para negociar
acordos comerciais, e quando o rei promove um
baile aos europeus; neste episódio fica
evidente a sabedoria de Mongkut ao fazer um
baile nos moldes europeus, o que faz com que
estes vejam com seus próprios olhos o
requinte da corte siamesa, assim como a riqueza
e poderio deste reino. Porém, segundo
Panikkar (1977) por esta época (1863)
os franceses dominavam o Camboja, área
que era de interesse dos siameses, que viram
na invasão francesa uma ameaça.
Quanto ao Estado, Mongkut inicia um rápido
processo de reforma ao qual o Sião
aproveitou-se das idéias e dos métodos
ocidentais sem perder sua independência.
O Reino do Sião foi o único de
todos os Estados do sudeste asiático
que resistiu à pressão do colonialismo
europeu, enquanto que ao mesmo tempo manteve
relações com as forças
externas européias. Segundo Villiers
(1966) os tratados diplomáticos e de
comércio de Mongkut com a Grã-Bretanha,
com a França, Estados Unidos, Dinamarca,
Portugal, Países baixos e Prússia,
tiveram grande importância tanto para
o Sião como para as potências européias.
Em 1868 foi confiado aos ingleses que ajustassem
novos tratados com a Bélgica, Itália,
Noruega e Suécia em nome de Sião.
Mongkut modernizou seu reino ao empregar europeus
a serviço de seu governo, empregou oitenta
conselheiros estrangeiros para ajudálo
a modernizar o país e contratou um outro
estrangeiro, que interferiu na educação
de sua própria família: a professora
inglesa Anna Leonowens. Como tutora real, ela
cuidou da educação de seus filhos,
entre eles seu sucessor Chulalongkorn, que se
tornaria o rei Rama V, introduzindo-o na língua
inglesa e nos conhecimentos científicos.
Anna teve grande importância e seu ensino
influenciou fortemente na atitude que Chulalongkorn
tomaria como rei ao suceder Mongkut. O filme
mostra de forma idealista a educação
que a professora impôs ao jovem príncipe.
O episódio de Anna ficou mundialmente
conhecido, inspirando livros, filmes e
musicais baseado nas memórias da própria
Anna Leonowens. A mais recente edição
em filme é de 1999, chamado "Ana
e o Rei", que conta sua trajetória
no Reino do Sião; filme protagonizado
pela atriz Judh Foster. "Ana e o Rei"
é uma adaptação livre do
livro de 1944 "Ana e o Rei do Sião",
de Margaret Landon, livro inspirado nas memórias
de Anna Leonowens.
“Ana e o Rei do Sião" deu origem
a um célebre musical da Broadway, "O
Rei e Eu", com música de Richard
Rodgers e letra de Oscar Hammerstein II. "O
Rei e Eu" é também o título
da respectiva versão cinematográfica,
produzida em 1956, com direção
de Walter Lang, e Yul Brynner e Deborah Kerr
nos principais papéis. Quarenta e três
anos passados sobre a sua rodagem, "O Rei
e Eu" permanece proibido na Tailândia.
O filme foi proibido pela censura tailandesa,
com alegações de que desrespeita
a monarquia e contém incorreções
históricas.
O filme é ilustrativo ao demonstrar o
choque cultural entre as duas nações,
Inglaterra e Sião, e as relações
dos siameses com os países europeus,
enfocando a habilidade com que o Sião
se defende da colonização européia,
o que não se encarna em uma atitude isolacionista
e defensiva, mas sim através da diplomacia
e habilidade administrativa.
Durante o filme o rei Mongkut mostra-se contrário
à atitude de seus compatriotas, que tentam
convencê-lo a iniciar uma luta armada
contra os imperialistas europeus. Mantém
em seu palácio uma professora inglesa
para educar seus filhos, e promove recepções
aos representantes das nações
européias.
De fato, a influencia européia estimulou
o rei a abrir rodovias, canais, pontes, inserir
navios a vapor, assim como mobílias e
vestimentas européias em seu próprio
palácio. Seu irmão criou uma oficina
de máquinas para fazer experimentos com
a ciência ocidental, e Bangkok foi conectada
a Cingapura por telégrafo, entre outras
inovações. “Mongkut soube aproveitar-se
da influencia européia para modernizar
seu país sem se submeter a nenhuma das
potências”. (VILLIERS, 1976)
Ninguém apoiou a abertura do Sião
com maior entusiasmo que seu próprio
rei. Mongkut subiu ao trono em 1824, mas seu
pai, Rama II, colocou Mongkut em um monastério,
presumidamente para mantê-lo seguro dos
apoiadores de seu irmão mais velho e
popular, o futuro rei Rama III, que subiu ao
trono três semanas depois a morte de Rama
II.
Mongkut não foi inativo durante os 27
anos do reinado de seu irmão. No monastério,
quanto mais aprendia sobre budismo, mais se
enfadava pelo andamento da religião no
Sião. Concluiu que monges e fiéis
seguiam as tradições cegamente
sem procurar o conhecimento dos textos originais.
Em seus estudos cuidadosos dos textos relativos
a ordenação de monges, acreditou
que as modernas ordenações siamesas
eram inválidas e respondeu criando sua
própria ordem de monges. Nela reformou
as práticas diárias, rituais e
preces e até a declamação
do Pale, a linguagem anciã dos textos
budistas. Sua tentativa de reformar o budismo
ganhou pequeno apoio, mas ele mostrou ser um
reformador dedicado. Quando Rama III estava
em seu leito de morte, a nobreza siamesa concluiu
que Mongkut era o melhor homem para o trono,
não importando se agradava a todos ou
não. Em uma demonstração
de unidade, eles passaram por cima dos filhos
do Rama III e elegeram Mongkut para ascender
ao trono.
De fato, apesar da pressão européia,
o Sião foi o único país
do sudeste da Ásia que nunca foi colonizado
pelos europeus. As duas maiores razões
para isso é que o país teve uma
longa sucessão de muito hábeis
governantes no século XIX, hábeis
em explorar a rivalidade e tensão entre
Franceses e Ingleses. Apesar disso, “a influência
européia conduziu muitas reformas no
século XIX e maiores concessões
aos interesses comerciais britânicos.
Isto incluiu a perda de três províncias
ao sul, que depois se tornaram os três
estados de possessão francesa.” (PANIKKAR,
1977).
Rama V
Chulalongkorn, ou Rama V, filho e sucessor de
Mongkut (Rama IV), tinha somente quinze anos
quando foi coroado, e reinou de 1868 a 1910.
Levou suas reformas bem mais longe que Mongkut.
Ao ser coroado em 1873 aboliu o costume de se
prostrar na presença do rei, e um ano
depois, decretou que ninguém nasceria
escravo. Acaba também com serviço
militar obrigatório no exército
e na polícia, e introduz um sistema fiscal
moderno. Efetua uma reforma na administração
local conforme sistema praticado com êxito
pelos britânicos na Birmânia, reorganiza
o sistema judicial com ajuda de um grupo de
juristas belgas.
Rama V, além de ter sua educação
iniciada por Anna, também estudou no
exterior. Teve sua formação básica
a influência da professora inglesa, e
como rei criou uma escola secular moderna no
palácio como exemplo do tipo de educação
que queria implementar no Reino do Sião.
Seu governo subsidiava a educação
universitária de trezentos estudantes
na Europa e América do Norte todo ano.
Cria um jornal semanal, The Royal Gazette, e
decreta a liberdade de imprensa, que foi garantida
por lei para encorajar o desenvolvimento de
outros periódicos. Também concede
liberdade religiosa. Moderniza seu exército,
erige prédios modernos em Bangkok e constrói
uma estrada de ferro. Em 1897 revisa o código
de leis para satisfazer idéias ocidentais
de justiça que o ocidente demandou antes
que os tratados desiguais pudessem ser negociados.
“O rei incrementa a produção de
arroz, havia muito mais terras para serem cultivadas,
mas havia falta de mão de obra, um dos
motivos do término da escravidão”.
(PANIKKAR, 1977).
A oposição à modernização
surgiu tanto na classe alta, que viu seu status
quo
diminuir, quanto no clero budista, que se viu
ofendido pela tolerância religiosa dada
aos missionários cristãos. Porém
o rei agia com sabedoria, pois era necessário
manter o equilíbrio diplomático
com os europeus, já que França
e Inglaterra estavam à espreita de novos
territórios.
Chulalongkorn preocupou-se com a saúde
de seu povo, introduzindo a medicina
moderna no país e importando vacinas,
que também encontraram resistência
dos “doutores tradicionais” que gozavam grande
influência entre a sociedade.
A modernização do Sião
no século XIX foi um esforço de
seus dois reis eruditos, que se sucederam somente
porque eles gozavam de poder absoluto sobre
seus súditos. Segundo Panikkar (1977)
a França não via com bons olhos
todas as transformações no Sião,
pois estas dificultavam seus interesses no país.
A Inglaterra por outro lado teve, devido a conjunturas
européias, de ceder espaços à
influência francesa no sudeste asiático.
“A criação do Estado moderno ocorreu
sem que fosse hipotecada a independência
do país, apesar das muitas concessões
dadas aos europeus” (VILLIERS, 1976). As políticas
de Chulalongkorn foram continuadas por seus
filhos Vajiravudh e Prajadhipok (respectivos
Rama VI e VII).
Ao analisarmos a história do reino de
Sião percebemos que este Estado esteve
sempre na periferia do sistema colonial europeu
na Ásia, porém sem deixar de fazer
parte deste sistema. O Sião foi uma exceção
na região, pois sempre manteve sua autonomia
frente ao avanço e as disputas européias
no sudeste asiático. Quanto ao filme
“Ana e o Rei”, trata-se de uma história
baseada nas memórias da senhora Anna
Leonowens e, portanto, impregnado de uma visão
européia sobre a cultura e a sociedade
siamesa. Mesmo assim a historiografia concorda
com o fato de que o rei Mongkut (Rama IV) desejava
realmente transformar o Sião numa nação
independente e politicamente autônoma,
porém inserida na economia do florescente
mundo moderno que os europeus propagandeavam
no oriente, ou seja, enquanto para haver autonomia
política era necessária a dependência
econômica. Tanto o filme como a historiografia
concordam que Mongkut foi o mais hábil
político do sudeste asiático do
século XIX, o que transformou o filme
numa referência sobre o Sião e
a Tailândia no ocidente.
Conclusão
Ao analisar o Sião pelo viés da
teoria do Desenvolvimento desigual e combinado,
podemos ver claramente o processo em que um
país de cultura tradicional e rígida,
como o Sião, tem o sistema capitalista
inserido em sua região através
do contato com países imperialistas,
como Inglaterra e França. Atos como a
interferência imperialista desses países
em sua economia e a ameaça de perca de
territórios e soberania forçou
o país a modernizar-se e assim a incorporar
o sistema capitalista.
O processo desse desenvolvimento, que se explica
pela teoria do desenvolvimento desigual e combinado,
deu-se pela união de elementos locais
com elementos “importados” dos países
capitalistas, tais como a indústria,
rotas de comunicação e legislação
ocidental. Desenvolve-se o proletariado na região
com o término da escravidão decretado
pelo rei Chulalongkorn, ou Rama V. O país
convive com elementos antigos de sua cultura
enquanto é obrigado a adotar traços
capitalistas, saltando etapas de desenvolvimento.
O que se tem é uma combinação
de elementos velhos e novos, que leva o desenvolvimento
do país em saltos ao capitalismo. É
isso que acontece no Sião e em outros
países afetados pelas influências
do colonialismo europeu. Alguns são totalmente
dominados, outros sobrevivem com sua autonomia
política, que é o caso do Sião,
que sabendo que não poderia fugir a influência
imperialista, assegura sua modernização
e sua autonomia política com eficientes
armas diplomáticas.
Este
artigo foi originalmente publicado nos Anais
da II Jornada de História das Relações
Internacionais - ANPUH-RS. Abril 2008.
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