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História Livre - História Contemporânea - História da América

A MULHER URUGUAIA E A MULHER BRASILEIRA
NO INÍCIO DO SÉCULO XX

Marcos Emílio Ekman Faber

Introdução

Na passagem do século XIX para o século XX, podemos perceber uma série de transformações históricas ligadas a relação de gênero, principalmente no que se refere à participação feminina na sociedade, assim como a ampliação dos direitos da mulher. Nosso artigo abordará algumas destas transformações. Tendo a virada de século como baliza temporal, nossa baliza geográfica se dará nas transformações ocorridas no continente sul-americano, mais precisamente nas transformações ocorridas no Brasil e no Uruguai.

Analisaremos comparativamente os casos uruguaio e brasileiro no que se refere ao controle demográfico, ao aborto, à literatura e à imigração. Para uma melhor comparação analisaremos os casos de demografia e aborto em conjunto, pois acreditamos que ambos fazem parte de uma mesma realidade. Os casos do papel feminino na literatura e na imigração serão abordados em seguida, sendo o caso da imigração, por uma questão de facilitar a compreensão da análise, nos detemos na comparação entre o caso uruguaio e brasileiro com ênfase no Rio Grande do Sul e em São Paulo.

Controle Demográfico e Aborto

O controle demográfico atendia a vários interesses, em primeiro lugar aos interesses estatais de controle populacional, em segundo lugar o controle exigido pela própria família e mais importante, o processo de emancipação feminina, onde a mulher exigia um melhor controle sobre o número de filhos que deseja ter, seja por questões econômico ou estéticos.

Para controle da natalidade, podendo-se destacar a questão do uso de métodos contraceptivos. Esta difusão dos métodos está associada ao surgimento de clinicas neo-Malthusianas que estavam preocupadas com o crescimento populacional. Estas clínicas tinham muitas mulheres à frente do processo, principalmente nos paises europeus, mas aqui nos deteremos na comparação deste processo no Brasil e Uruguai.

Quanto a questões de caráter feminista, podemos perceber que o Uruguai estava à frente em relação ao Brasil. Pois na virada do século XIX para o XX os movimentos feministas no Uruguai questionavam as bases sociais e da família. Essas mulheres queriam ter a mesma liberdade sexual que gozavam os homens e o direito de fazer do seu corpo o que desejassem, sendo então, a mulher solteira e maior de idade a dona de si mesma. Queriam também o direito de poder decidir o número de filhos que desejavam ter. Em primeiro plano estava a questão da liberdade sexual. Enquanto no Brasil o movimento feminista do mesmo período, foi caracterizado por Celi Pinto, como movimento “bem comportado” devido seu caráter conservador. O movimento não questionava a opressão das mulheres, não desejava alteração das relações de gênero, as brasileiras queriam apenas o direito a cidadania (PINTO, 2003).

O que não era questão central do movimento Uruguaio, porém estas feministas uruguaias também são apontadas pela historiografia como precursoras das lutas por direitos sociais e políticos. A transição demográfica no Uruguai é apontada pela maioria dos autores, que tratam do assunto, como conseqüência da nova estrutura produtiva do país. Porém estudos mais recentes vinculam está transição também as mudanças nos costumes familiares. Para os autores de Historias de la vida privada em el uruguay a transição demográfica e as consolidações da classe médias são características da modernização do país (PELEGRINO, 1997). Esses fatores que contribuíram para o surgimento de um novo modelo de família e um papel distinto para as mulheres. A modernização do país e a consolidação de classe média levaram a um novo modelo de família. Um novo papel para mulher também é conseqüência deste processo, porém a transição demográfica não pode ser fator para o surgimento de uma nova mulher. E sim o contrário, pois foi a nova mulher quem proporcionou esta transição, sendo então sujeito deste processo. Estas mudanças nos costumes familiares estão diretamente ligadas ao movimento feminista, trazendo a cena uma nova mulher. “Os artigos de Joana Maria Pedro e Graciela Sapriza tratam respectivamente dos processos históricos envolvendo as políticas de ação contraceptiva e as disputas em torno dos direitos das mulheres no Uruguai nas primeiras décadas do século XX. Como historiadoras, as duas autoras mostram as dinâmicas sociais complexas que reuniam os mais diversos agentes a fim de definir direitos sociais e políticas públicas, especialmente nas lutas em torno do aborto. Apoiando-se em Foucault, Joana Pedro explora como as populações foram tornando-se objeto central das ações governamentais, boa parte delas envolvendo o controle de natalidade” (PELLEGRINO, 1997, p.117).

Enquanto no Brasil, a preocupação com o controle da natalidade foi mais expressivo na década de 1960, com a criação do BEMFAM, no Uruguai, esta transição demográfica acontece entre 1915-1919, portanto bem anterior ao Brasil que na década de 1960, tem a elevação da taxa de fecundidade de 6,21% para 6,28%, e só a partir da década de 1970 se tem à diminuição da taxa de fecundidade. A transição demográfica nestes dois paises é conseqüência da diminuição da taxa de fecundidade.

Alguns dos métodos utilizados para diminuição da fecundidade no Uruguai foram o matrimonio tardio e o preservativo. Porém, o método mais difundido pelos uruguaios era o aborto. No Brasil se a adoção de métodos anticoncepcionais mais eficientes tem reduzido o número de gravidez. A entrada da mulher no mercado de trabalho, também contribuiu para a diminuição no número de filhos por casal, no Uruguai também foi fator. Enquanto nas décadas de 1950-60 uma mulher brasileira, em média, possuía de 4 a 6 filhos, hoje em dia um casal possui um ou dois filhos, em média.

No Inicio do séc XX o aborto era a muito praticado no Uruguai, em número muito superiores ao Brasil do mesmo período. Os abortos no Uruguai eram feitos por parteiras, que atendiam em suas residências. O método utilizado por essas parteiras era o da sonda. Era feito quando a mulher estava com menos de sete semanas sem menstruar. Em primeiro lugar a parteira fazia um exame manual interno para determinar o tamanho do feto e a posição do útero, depois lavava a vagina com uma solução anti-séptica e com uma agulha fina anestesia o útero em três pontos, prendia-se então o órgão com um tipo de fórceps chamado tenáculo, em seguida, introduzia-se no útero uma sonda de plástico fino e flexível. Na sonda ligava-se um aparelho de sucção e removendo o endométrio e os produtos de concepção. A mulher que fazia o aborto, depois da operação podia ter cólicas uterinas, náuseas, suor e reações de fraqueza. As parteiras confirmam que muitas vezes o aborto era feito pela própria gestante, introduzindo objetos pontiagudos.

No Brasil encontramos duas técnicas abortivas feitas pelas “comadres” parteiras. Porém, a mais utilizada no período era de tradição indígena, tratava-se de uma infusão de folhas de arruda. Esta técnica era praticada por mulheres que tinham de manter sozinhas, ou com grandes dificuldades, sua prole, ou entre aquelas cuja prole manifestava publicamente o pecado sexual ou desonra para mãe. As mesmas motivações se encontravam nos abortos feitos no Uruguai, porém pode se incluir duas outras motivações ao aborto que não aparecem no Brasil. Primeiro o desejo das mulheres de escolherem o número de filhos que desejavam ter. E segundo a posição da sociedade a favor de um controle de taxa de natalidade.

O Uruguai constatou uma crescente no número de abortos praticados da virada do século XIX para o século XX, no ano de 1924 a prática abortiva era cento e vinte vezes maior que no ano de 1899, isso preocupou os médicos uruguaios. De 1934 a 1938 o aborto foi despenalizado, um dos argumentos utilizado a favor, foi o alto numero de mortes de mulheres de classe popular ao realizarem a prática. Mas a Lei 9763 de 1938 voltou a considerar que o aborto é sempre um delito, cuja pena pode ser atenuada ou eximida se for praticado por um médico, desde que nos três primeiros meses da gravidez e dentro das seguintes circunstâncias: salvar a própria honra, a da esposa ou de um parente próximo; o móvel da honra não ampara integrantes da família do autor da gravidez; para eliminar o fruto de uma violação; por causas graves de saúde; e por angústia econômica. A lei não é implementada e não há serviços que realizam abortos por estas causas. O juiz só pode atuar diante da denúncia do delito cometido. Já no Brasil o Código Penal da República, de 1890, introduziu a punição das mulheres que praticassem o aborto. Mas estabeleceu atenuantes para os casos de estupro em que o recurso do aborto visava ocultar a desonra própria. Também adotou a noção de aborto legal e necessário quando não houvesse outro meio de salvar a vida da gestante. O Código Penal de 1940 trata do aborto no Título I (Dos Crimes contra a Pessoa) Capítulo I (Dos crimes contra a vida), criminalizando-o em todas as hipóteses, exceto quando se trata de salvar a vida da gestante ou quando a gravidez resulta de estupro. Nos dois casos extingue-se a punibilidade, ou seja, o direito do Estado de punir a prática do aborto executado por médico, daí serem consideradas como hipóteses de Aborto Legal.

Nas primeiras décadas do século XX, a maioria dos partos era feita nas próprias casas. É a partir da década de 1930, que cresce a participação de médicos na realização de partos. Porém enfrentado uma resistência da sociedade, pois a prática de fazer os partos em casa era uma tradição muito forte no Uruguai. Em 1915 as parteiras uruguaias se profissionalizaram, entrando para a faculdade de medicina, perante a prestação de um exame. O curso era gratuito e durava três anos, as parteiras eram geralmente de classes pobres, o que gerava um grande preconceito contra elas dentro da faculdade. Elas trabalhavam para pagar seus livros. Quando recebiam o diploma, montavam seus consultórios em casa, colocavam uma placa na porta do seu “consultório”, com o certificado da universidade. Na verdade, as classes uruguaias mais populares pouco iam ao hospital. Nos casos de parto utilizavam o serviço das parteiras, só chamavam os médicos em partos mais difíceis.

No Brasil, nas primeiras décadas do século as consultas ginecológicas e os partos eram realizados pelas parteiras, sobretudo no domicilio da parturiente ou de pessoa de sua relação. Desde o século XIX, pelo menos nas principais cidades do país, havia parteiras que faziam partos em suas próprias casas, tendo quartos especiais para a prática. Com o passar dos anos essa forma de atendimento se ampliou e alguns estabelecimentos passaram a ser conhecidos pelo nome de “Casas de Maternidade”. Nestas casas, eram atendidas em geral mulheres que por alguma razão estavam impedidas de dar à luz junto da família – as provenientes do interior, mães solteiras e mulheres viúvas. As parteiras podiam fazer abortos, sendo por isso denunciadas ao longo da segunda metade do século XIX, até serem proibidos de funcionar. No Regulamento da Escola de Parteiras de 1915, verifica-se que a idade mínima exigida da candidata, na época da matrícula, era de 18 anos, além de exame de admissão e pagamento da taxa exigia-se atestado de boa conduta e de não sofrer moléstias infecto-contagiosas e atestado de vacina contra a varíola. Eram isentas do exame de admissão as candidatas que tivessem prestado exames finais nos ginásios oficiais e escolas normais. Na hospedaria dos Imigrantes, em São Paulo, por exemplo, havia o cargo de “parteira-enfermeira”, porém este cargo foi extinto em 1899, quando o serviço de partos ficou a cargo do médico e foi criado o cargo de enfermeira. Outro sinal dos novos tempos, as parteiras pouco a pouco viram suas antigas atribuições apropriadas, em parte, pelo exercício da Obstetrícia pelos médicos, em parte, e pelas enfermeiras, devido entre outras razões, à crescente importância da Medicina Preventiva e às modificações e ampliações dos serviços de saúde, tais como a criação de hospitais, maternidades e centros de saúde.

O feminino na literatura brasileira e uruguaia

Quaisquer que fossem seus nomes e procedências, as publicações literárias uruguaias do fim do século XIX e inicio do século XX gozavam de grande apreço entre o público feminino. Alguns casos literários podem provar isso. As mulheres uruguaias eram vigiadas pela moral, e isso fazia com que tivessem tempo de investir na leitura, tempo para pensar em amores ansiosos, assim como para descobrir em assuntos publicitários e nesses mesmos produtos literários um corpo de valores e uma série de representações de si mesmas, que acabaram contribuindo para formar sua sensibilidade. Este enclausuramento de raiz hispânica gozava de uma larga tradição nas terras uruguaias (ROCCA, 1997). Também se pode afirmar que no Brasil a coisa não era muito diferente, as mulheres gozavam de pouca liberdade em todos os campos e se apresentavam em posições subalternas (DUARTE, 1993).

Durante o século XIX, principalmente nos primeiros trinta anos, as mulheres dos círculos sociais favorecidos não eram presas do horror que as cercou posteriormente em função de terem que perder “indesejados quilos a mais”. Assim ao final dos anos trinta a medicina investiu em mostrar as múltiplas inconveniências para a saúde de um corpo acima do peso. Os hábitos foram mudando e as tendências da moda desenharam um novo modelo de mulher que iam alem das prescrições medicas. Muito disto se encontra na literatura da época e em alguns escritos privados como cartas. Não raramente os contos da época citavam esse modelo de beleza feminina para a Montevidéu burguesa. Outras formas de perceber essa “ditadura da beleza” esta nos escritos que citam as praias uruguaias, dentre eles podemos destacar os de Josefina Lerena Acevedo de Blixen entre 1889-1957 (ROCCA, 1997).

Em 6 de julho de 1909, a quatrocentos quilômetros da capital uruguaia, na cidade de Melo, uma adolescente dezessete anos escreve um artigo cujo título era “Direitos Femininos”, no qual manifesta sua esperança de que com a chegada das ferrovias também cheguem profundas mudanças à condição da mulher. Os escritos feministas tomavam forma mais consistente através da escritora Maria Abelle de Ramirez. Ela batia forte contra os escritos sobre a ditadura da beleza. Para ela o que deveria ser observado era o corpo saudável e a alegria da mulher em vestir-se bem (ROCCA, 1997).

O escritor uruguaio que mais se preocupou com os gostos e a psicologia do publico feminino nessa época, foi com certeza Horacio Quiroga (1878-1937). As mulheres jovens da ficção quiroguiana são em sua maioria reprimidas, com desejo de noivar e em muitas vezes sedentas por sexo, sendo sempre vigiadas por alguém, geralmente pela mãe que espera que a filha esteja dentro de um processo matrimonial adequado. De certo modo essa degradação das adolescentes de Quiroga em mulheres adultas viciosas e de mães gordas de caráter perverso prefigura a visão de escritores como Juan Carlos Onetti, que com outra perspectiva defende que a mulher preserva sua pureza apenas na adolescência.

Para adquirirem maior arrojo, as mulheres teriam que sobrescrever a imagem sacralizada e puramente espiritual ao qual sempre estiveram ligadas. Esse processo não só contribuiu para a progressiva participação da mulher no trabalho e nas atividades sociais, mas também no cinema, ao qual Quiroga tinha grande admiração.

Na década de vinte ficava claro que revistas como “Caras y Caretas” chegavam para ficar e ganhavam grande espaço entre o publico feminino. Nelas as mulheres ficavam sempre informadas sobre diversidades. O sucesso desse tipo de revista ainda pode ser observado hoje.
No Brasil a construção do feminino na literatura pode ser destacada em escritos machadianos, como “Missa do Galo” e “Dom Casmurro”, e obras clássicas como “A Moreninha” de Macedo, “Luciola” e “Senhora” de Jose de Alencar. Nessas obras fica perceptível que a mulher e sempre relacionada ao mundo domestico (DUARTE, 2003).

Constância Duarte (1993, p. 99) alerta que no Brasil algumas jornalistas que em geral nunca ocupavam cargos importantes em grandes jornais, chegam a fundar algumas series de jornais dirigidos e escritos por mulheres. O “Jornal das Senhoras”, o “Belo Sexo”, o “Sexo Feminino”, “A Mulher” e “A Família” são belos exemplos dessa empreitada feminina na literatura jornalística brasileira do fim do século XIX.

Em ambos países podemos perceber que a representação do feminino na literatura revela os preconceitos sofridos pelo gênero. A mulher é sempre posta numa posição subalterna em relação ao homem. Sofre imposições de beleza pelas revistas, tornando-se uma grande força consumidora devido a sua relação com o mundo doméstico e a clausura do lar. Percebemos que as revistas ditam à moda a ser seguida, dizendo a elas aquilo que devem usar, o que devem fazer, como devem comportar-se e como devem pensar. Talvez as maiores diferenças estejam no fato de que no Brasil do período abordado, muito mais mulheres escreveram, dedicando-se a esta atividade, apesar de poucas terem seus livros publicados. Algumas ainda conseguiram publicações em periódicos e artigos em jornais.

Em suma, o feminino manteve-se sempre em estado secundário tanto no caso brasileiro quanto no caso uruguaio. Nunca sendo tratado com a mesma significância do masculino. Tanto no Brasil quanto no Uruguai a construção do feminino na literatura prendeu-se a realidade, ainda muito dura com as mulheres, que sofriam muito preconceito, quer seja escrevendo, quer seja sendo representadas literariamente.

A Imigração

Podemos destacar o movimento migratório como um movimento de força de trabalho, estando ligadas às inúmeras transformações nas estruturas política, econômica e social da Europa. A Itália que passava por um processo de unificação, onde a emigração esta ligada a este fato, significando o avanço do capitalismo. A unificação da Itália afasta de uma vez o avanço das idéias revolucionarias socialista, e se torna um instrumento para remanejo das forças detentoras do poder, com a burguesia assumindo a dianteira do novo sistema. Ainda sendo um pais agrário, os habitantes dos campos não viam alternativas para uma melhora econômica, o atraso nas relações sociais não permitiam um impulso para o desenvolvimento econômico, levando as massas populares a miséria. Este fator foi o gerador para o processo de imigração italiana. Foram registrados uma média de 135 mil emigrantes por ano entre 1876 e 1885, que se deslocavam dos países europeus e do Mediterrâneo, enquanto isto, o número de imigrantes para as Américas sofre um considerável aumento a cada ano que passa.

A saída de seu país de origem leva aos imigrantes italianos ao encontro com o inesperado, uma terra nunca vista, totalmente estranha, uma cultura diferente os espera, isto por almejarem uma condição de vida melhor. Para chegarem ate seu destino, durante a viagem enfrentavam inúmeros obstáculos, alem de ser uma viagem dura e cansativa, enfrentavam males como moléstias, doenças e epidemias, muitos imigrantes não agüentavam a dura viagem e morriam antes mesmo de chegarem em seu destino. Os imigrantes terão que se organizar nesta nova terra, em sua bagagem trouxeram seus costumes, sua cultura e novas tecnologias principalmente no cultivo agrícola.

Como de costume, as formações sociais dos imigrantes italianos eram desempenhadas pela família, as atividades econômicas também foram desempenhadas pela família. A divisão do trabalho ocorre da diferença de idade e do sexo, dês de muito cedo as crianças ajudavam no trabalho diário das lavouras, as meninas ficavam somente com o trabalho de casa, sob vigilância da mãe.

A analise a seguir segue sob uma comparação do processo migratório italiano para o Brasil e também para o Uruguai, com um enfoque na mulher italiana, como ela se mostrava integrada no contexto uruguaio e brasileiro, qual era seu papel e como ela se mostrava presente no âmbito familiar.

O trabalho duro e cansativo envolvia toda a família, na divisão do trabalho tanto no Brasil como no Uruguai vemos uma posição de primazia do homem e a mulher ficando subordinada a ele. Mesmo assim os homens ocupavam-se do trabalho do campo, no tratamento de animais, eram responsáveis pelo trabalho pesado. A mulher ficava encarregada da organização do lar, ao preparo de alimentos, as mulheres também desempenhavam as atividades ao lado dos homens no campo, nas grandes plantações de milho e trigo, os se dirigiam para as lavouras no raiar do dia, as mulheres iam mais tarde ficando responsáveis por levarem a refeição da manhã.

No caso brasileiro a mulher alem de trabalhar nas lavouras, cuidava do trabalho doméstico no preparo de alimentos e no âmbito geral da casa. A mulher italiana tinha uma rotina muito dura, o crescimento das famílias italianas era um fato ocorrente, com o numero de filhos aumentado, à mulher desempenhava suas atividades diárias mesmo estando no período de gestação, muitas perdiam seus filhos no parto devido ao duro trabalho que realizavam. Somente no período da quarentena, a mulher era afastada de seus afazeres, estando em repouso, uma serie de cuidados eram tomados pelas mulheres que recentemente haviam dado a luz.

Não muito diferente do caso uruguaio, no Brasil, tanto a mulher como os homens estão igualmente estruturados. As funções e trabalhos de homens e mulheres serão distintos. A mulher será colocada à frente no âmbito familiar, ela regulará a família, e o seu lar, além de desempenhar outras atividades ao lado de seu marido. Tanto no caso brasileiro como no uruguaio, a mulher será responsável pela administração da casa e da família.

Um aspecto evidente no caso brasileiro, e que no uruguaio não á menção sobre o assunto, é a gerencia do dinheiro. Ficando a cargo do marido, percebe-se com mais clareza no caso brasileiro a mulher distanciada da vida social e econômica de seu marido, ele por sua vez é um freqüentador assíduo de jogatinas, tendo uma vida social bastante ativa, e a mulher sujeita a estas arbitrariedades do homem fica em casa cuidando dos filhos ocupada com os afazeres domésticos.

No caso uruguaio, temos uma mulher italiana que sabe superar suas diferenças, mesmo sem saber ler e escrever, as mulheres italianas tomam seu espaço na sociedade e aparecem com muita força na estrutura familiar. Foram anos de muito sofrimento, exercendo tarefas tradicionais no âmbito familiar, a mulher italiana do caso uruguaio, mostra suas habilidades administrativas junto a seu marido nas atividades diárias de seu próprio comércio, ou em qualquer outra atividade exercida. Diferente do caso brasileiro, a mulher italiana no Uruguai aparece com mais força em uma esfera administrativa junto com seu marido no trabalho, enquanto que no Brasil a mulher desempenha suas atividades junto ao seu esposo, mas em um núcleo mais agrário, mais rural. Tanto no Brasil como no Uruguai, a mulher italiana é responsável pelo trabalho doméstico e organização do lar, já os homens ficam responsáveis pelo trabalho braçal.

Este empresariado imigrante que surge no Uruguai ergue-se rapidamente em meio a um mundo burguês totalmente solidificado. Por volta de 1870, as colônias de imigrantes já estavam instaladas, e seus membros já tomavam seu espaço na economia local, muitos destes estavam envolvidos com a industria local. Em contraste com o Brasil, no Uruguai os imigrantes italianos estão envolvidos especialmente com a indústria, e muito raro com a agricultura. Enquanto que no Brasil os imigrantes mantêm-se ligados à agricultura, apesar das diferenças regionais, pois em São Paulo estão ligados à agricultura cafeeira e Rio Grande do Sul à pequena propriedade rural.

Ainda que com suas restrições, no caso uruguaio, a mulher aparece com maior independência em relação ao caso Brasileiro, e tendo as mesmas obrigações com a família que a imigrante italiana do Brasil. No caso uruguaio a mulher italiana era mais participativa, estando ao lado do marido nos negócios, ela busca uma valorização social, a busca pela ascensão também na sociedade. A busca da ascensão social da mulher era algo eminente, este reconhecimento social deve ser lavado em conta pela rapidez da ascensão econômica da maioria das famílias italianas, esta rápida ascensão se deu em média após dez anos da chegada das famílias italianas, é um processo muito rápido, se levarmos em conta a situação econômica da época.

No Brasil por sua vez, as famílias italianas estabeleceram suas atividades econômicas na agricultura pela situação econômica vivida no país, a carência de mão-de-obra era um destes motivos, a busca pela mão-de-obra imigrante esta relacionada à substituição do trabalho escravo pelo trabalho livre. Por este motivo a mulher italiana, que vivia no campo isolada no interior, não tinha oportunidade de se expandir socialmente e não via nesta uma necessidade, ela defendia seu papel no meio onde estava inserida, não era realmente reconhecida pelas suas atribuições, e sim exercia sua função conforme mandava os costumes daquela sociedade, costumes estes que vieram trazidos em suas bagagens de sua terra de origem.

Podemos eleger duas diferenças entre os imigrantes italianos do Brasil e do Uruguai. O fato dos italianos no Uruguai terem tido uma maior ascensão econômica em relação aos italianos no Brasil, deve-se pelo tardio processo imigratório. No Uruguai a imigração italiana inicia em 1920, no Brasil a imigração ocorreu anterior a esta data tendo inicio em 1880. Por este motivo, se compararmos a mulher italiana no Uruguai com a mulher italiana no Brasil, perceberemos que sua posição perante a sociedade esta expressa de forma diferenciada uma da outra.

Conclusão

Não é difícil perceber as similaridades e diferenças entre o papel desenvolvido pela mulher no Uruguai e no Brasil da virada dos séculos XIX para o XX. Mas percebemos que as diferenças ocorrem muito mais em cima de transformações sociais que cada país sofreu, do que necessariamente da pressão exercida por movimentos organizados de mulheres, até por que estes movimentos ainda engatinhavam.

As transformações ocorridas no período e que beneficiaram as mulheres se deram em função da conjuntura política e econômica que estes países enfrentavam. É latente que os movimentos feministas neste período eram incipientes e pouco interviram na melhora das condições femininas nestes países, porém não podemos deixar de salientar o papel heróico destas mulheres da virada dos séculos XIX para o XX, pois foram mulheres que viviam basicamente para a família numa sociedade dominada pelos homens, mas foi neste primeiro quarto do século XX, que as mulheres alcançaram seus mais amplos direitos, que se verão nas décadas seguintes, como por exemplo o direito ao voto e direitos trabalhistas. Porém, não é nos casos brasileiro e uruguaio aqui analisados que estas conquistas são sentidas, mas é aqui que percebemos as transformações que serão sentidas no futuro próximo e que possibilitarão estas conquistas.

Nesta análise, percebemos que a vida das mulheres, no período, era muito dura, pois trabalhavam em jornada dupla, principalmente no caso das imigrantes italianas e no caso das parteiras. Estas dificuldades eram agravadas no plano econômico o que gerava uma grande ansiedade às mulheres, pois o aumento do número de filhos representava menos renda e maiores dificuldades de sobrevivência. É dentro desta realidade que os métodos contraceptivos e abortivos se farão, em alguns casos, uma prática comum.

Mas é neste período também que perceberemos uma maior autonomia feminina, pois as práticas de controle da natalidade serão mais acessíveis do que antes. Assim, permitirá que jovens mulheres optem por uma vida independente, como é o caso uruguaio das parteiras, que tinham na profissão uma possibilidade de ascensão social, principalmente depois da institucionalização da profissão. Acreditamos que esta seja uma das principais modificações do período e que serão sentidas no futuro próximo e possibilitarão novas conquistas.

 


Referências Bibliográficas

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