
História Livre - História Brasil - Relações
Internacionais
RELAÇÕES
INTERNACIONAIS DO BRASIL: DEPENDÊNCIA
E BUSCA POR AUTONOMIA
Marcos
Emílio Ekman Faber
Introdução
As relações do Brasil com outras
nações sempre estiveram associadas
ao potencial agro-exportador do país,
ou seja, as relações brasileiras
com as nações estrangeiras se
davam de acordo com os interesses do mercado
externo com relação aos produtos
agrícolas nacionais – açúcar,
café, cacau, algodão, etc. – e,
claro, a dependência nacional aos produtos
industrializados das nações capitalistas.
Somente após a II Guerra Mundial o Brasil
passou a ter poder de decisão em suas
medidas quanto ao mercado externo, porém,
as relações diplomáticas
brasileiras ficavam muito restritas aos países
de capitalismo industrial adiantado.
Somente com as políticas econômicas
iniciadas no governo Getúlio Vargas que
o país passou a ter certa autonomia frente
ao mercado externo. Principalmente quando aplicada
a política de substituições
das importações, pois a dependência
brasileira aos produtos industrializados diminuiu
consideravelmente, dando ao país maior
poder de barganha frente às potencias
capitalistas. Porém, o Brasil sempre
esteve à mercê da hegemonia de
uma grande potência mundial. Primeiro
com a Inglaterra, herança do período
imperial, e, depois, com os Estados Unidos da
América no século XX.
Dentro deste contexto a política externa
nacional sempre esteve associada aos interesses
internacionais sobre o Brasil, gerando no país
uma dependência ao capital externo e aos
produtos industrializados importados destas
nações. Situação
que somente se alterou após a década
de 1930.
Neste breve artigo, me proponho a examinar como
ocorreu a passagem da dependência externa
brasileira para a inserção do
país como nação autônoma
no campo internacional. Entendendo que as relações
internacionais brasileiras sempre atenderam
aos interesses das potências capitalistas,
como alternativa a este modelo de dependência,
o país buscou tornar-se uma potência
regional, sendo um parceiro estratégico
das nações mais desenvolvidas
na América Latina.
Dependência
e busca por autonomia
A história do Estado brasileiro iniciou
com a chegada da Família Real Portuguesa
ao país em 1808, a economia brasileira
nasceu associada e dependente da inglesa. Esta
situação não se modificou
até o início do século
XX, quando a esfera de influência nacional
passou da Inglaterra para os Estados Unidos
da América. Situação de
dependência que somente sofreu abalos
após a II Guerra Mundial, durante o governo
Getúlio Vargas.
O governo Vargas impôs ao Brasil a chamada
Barganha Nacionalista-Pragmática (VIZENTINI,
1995, p. 145), onde o país aproveitou-se
da política externa estadunidense, a
chamada “doutrina da reserva estratégica”,
onde o continente sul-americano apresentava-se
para os EUA como sua zona de influência.
Porém,
"Essa
barganha visava redefinir os laços de
dependência face aos EUA, de forma a obter
apoio ao desenvolvimento industrial brasileiro.
A falta de uma resposta positiva por parte dos
Estados Unidos convenceu lideranças brasileiras
da época da necessidade de ampliar os
vínculos internacionais do Brasil. Fazia-se
necessário atuar num plano mundial, escapando
à dependência hemisférica
frente aos EUA, não obstante isso permitisse
ampliar a própria barganha com esse país.
Embora esse processo começasse a emergir
desde o segundo Governo Vargas, foi com a Política
Externa Independente de Jânio Quadros
e João Goulart, entre 1961 e 1964, que
ela se configurou de forma explícita
em nossa agenda diplomática." (VIZENTINI,
1999, p. 136).
Quando Getúlio Vargas iniciou a política
de barganha brasileira, apoiando os Estados
Unidos no plano estratégico, ele estava
atrelando o auxílio econômico estadunidense
como condição fundamental para
o sucesso do projeto de industrialização
e desenvolvimento do país (VIZENTINI,
1999, p. 136). Assim, o país passava
a buscar uma redefinição de seu
papel na economia mundial, isso se refletia
principalmente no desenvolvimento econômico
e na industrialização brasileira.
Neste período, Brasil e Argentina buscaram
forjar as bases de um plano de integração
econômico regional, o chamado Pacto ABC
– formados por Argentina, Brasil e Chile, considerados
por Perón, então presidente da
Argentina, as principais economias da América
do Sul –, este pacto foi a primeira tentativa
de integração regional, neste
sentido os governos argentino e brasileiro tentaram
criar uma esfera de influência sobre a
América Latina (ALMEIDA, 1998). O ABC
inaugurou o fim da política bilateral
com os EUA, inaugurando as políticas
multilaterais, pois como individualmente não
eram capazes de exercer uma forte influência
sobre a região, uniram forças
neste sentido. O ABC foi o embrião do
Mercado Comum do Sul (Mercosul). Curiosamente
o Chile, anos mais tarde, não participaria
da fundação do Mercosul.
Já durante o governo Juscelino Kubitschek
foi criada a Operação Pan-Americana
(OPA) que representou a busca do governo brasileiro
por lançar o país como uma liderança
regional na América Latina. Porém,
a OPA também foi utilizada como instrumento
de barganha com os Estados Unidos (VIZENTINI,
1995). Pois, com o OPA, Brasil não só
forjou uma série de laços com
países da América Latina, como
com países do mundo socialista. Juscelino
e seus sucessores buscavam na multilateralização
e na barganha com os Estados Unidos, uma redefinição
da dependência brasileira (VIZENTINI,
1999, p. 136). Assim, o país passava
a buscar uma redefinição de seu
papel na economia mundial, isso se refletia
principalmente no desenvolvimento econômico
e na industrialização do país.
Na década de 1960, o presidente Jânio
Quadros lançou as bases da Política
Externa Independente (PEI), que surgiu a partir
de um conjunto de princípios e atitudes
independentes durante o governo Jânio.
A Política Externa Independente estava
apoiada: na expansão das exportações
brasileiras para todos os países, inclusive
socialistas; na defesa do direito internacional,
da autodeterminação dos povos;
na política da paz, desarmamento e coexistência
pacífica; no apoio à descolonização
completa de todos os territórios, principalmente
da África; na formulação
autônoma de planos nacionais de desenvolvimento
(VIZENTINI, 2003). Essa política independente
seria seguida por João Goulart.
A PEI possibilitava ao Brasil uma autonomia
externa invejável, pois o país
passou a exercer um papel de importância
significativa na América do Sul. Qualquer
nação que desejasse exercer papel
hegemônico no continente sul-americano
necessitaria do Brasil como aliado estratégico.
Assim, a condecoração de Ernesto
Che Guevara com a Ordem do Cruzeiro do Sul pelo
presidente Jânio Quadros atendiam as demandas
simbólicas desta política. Outra
questão significativa foram as negociações
e os acordos comerciais com países socialistas,
como a China e a URSS. Tais medidas colocavam
o país como um possível aliado
destes regimes na América. Também
foi importante a decisão de apoiar a
independência de nações
africanas. Estas políticas visavam favorecimentos
no campo político e econômico junto
aos Estados Unidos. A PEI foi mantida por João
Goulart quando este assumiu a presidência
após a renúncia de Jânio
(VIZENTINI, 2003).
Após o Golpe Civil-Militar de 1º
de abril de 1964, o regime ditatorial passou
por duas fases principais, a primeira onde prevaleceu
a Doutrina de Segurança Nacional que
representava o alinhamento automático
do Brasil junto aos EUA. E a segunda fase onde
a política de Pragmatismo Responsável
e Ecumênico buscou a aproximação
brasileira com países Árabes e
Socialistas, assim como novamente buscou a aproximação
com a Argentina (VIZENTINI, 2003). Esta segunda
política buscou a redefinição
do país como uma potência regional
na América Latina. Mas novamente ficou
claro que o Brasil necessitaria de um aliado
estratégico com quem poderia dividir
a conta desta liderança regional.
O governo José Sarney voltou suas atenções
para a reaproximação com os EUA.
Apesar de afastar-se do Terceiro Mundo, lançou
as bases do Mercosul (VIZENTINI, 2003). Já
na década de 1990, prevaleceram as políticas
neoliberais, onde o país ficou submetido
às potências capitalistas (VIZENTINI,
2003) e a dependência ao capital externo
e ao Fundo Monetário Internacional (FMI).
Os governos que se seguiram com a redemocratização,
apesar das diferenças significativas
entenderam que a hegemonia regional somente
poderia ser alcançada com a divisão
das despesas desta liderança, ou seja,
teria que ser uma hegemonia compartilhada e
o Mercosul possibilitou esta co-hegemonia regional
com a Argentina. Mesmo assim, os governos neoliberais
de Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique
Cardoso buscaram um alinhamento aos Estados
Unidos da América. A exceção
no período ficou com Itamar Franco que
estreitou os laços com os países
do Mercosul, mesmo que não tenha mantido
as relações com os EUA.
Entre os governos Itamar e FHC foram feitas
as primeiras tentativas, por parte dos EUA,
de criação da Área de Livre
Comércio das Américas (ALCA) e
o Brasil se impôs diplomaticamente e criando
a ALCSA, como forma de contrabalancear a integração
no continente americano. Este ocorrido fortaleceu
a liderança brasileira no contexto regional
sul-americano.
Em 2002, quando Luis Inácio Lula da Silva
assumiu a presidência do país,
o governo brasileiro passou a buscar autonomia
no campo internacional. O país se voltou
para a consolidação do Mercosul
e para a ampliação o diálogo
Sul-Sul com países emergentes do hemisfério
Sul, tais como Coréia do Sul, África
do Sul, China, Índia, Irã, etc.
(VIZENTINI, 2003). Tais acordos demonstram que
o país está no rumo da criação
de um grande mercado entre países emergentes,
onde o Brasil ocuparia papel de destaque, não
como nação hegemônica, mas
com a hegemonia compartilhada com outras nações.
Conclusão
Durante as décadas de 1930 e 1960, os
governantes brasileiros buscaram, de formas
distintas, a libertação da economia
nacional de sua dependência a uma só
potencia mundial, no caso os Estados Unidos
da América, para isso buscaram nas políticas
de barganha e independência externa sua
autonomia no campo político e econômico,
porém estes projetos acabaram fracassando,
não por serem equivocados, mas por representarem
riscos as elites aristocráticas brasileiras
que entravam em declínio com o fim da
função agro-exportadora do país.
Destes gerou-se o apoio ao Golpe Civil Militar
de 1964 que pôs fim as políticas
de autonomia brasileiras frente ao mercado externo.
Já o período neoliberal criou
uma estrutura de dependência do país
ao capital externo, porém, foi neste
mesmo período que o Mercosul foi instituído
sendo um instrumento de consolidação
do Brasil como nação hegemônica
no continente sul-americano, porém, na
impossibilidade de bancar sozinho esta hegemonia,
ela é compartilhada com a Argentina.
Fora da América, o Brasil também
tem buscado parceiros que lhe garantam uma hegemonia
compartilhada dos novos mercados emergentes,
daí a participação brasileira
no G-20, G-3 (Brasil, Índia e África
do Sul), acordos diplomáticos com a França,
a China e o Irã e a busca por uma cadeira
no Conselho de Segurança da ONU. Tais
acordos têm a função de
inserir o Brasil num papel de destaque no cenário
mundial garantindo-lhe o destaque de ser um
parceiro estratégico na América
Latina e no Hemisfério Sul, lugar que
parece ocupar no momento.
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